sábado, 6 de fevereiro de 2010

Por que não gosto da teologia da prosperidade

Eu não gosto da teologia da prosperidade. Procuro respeitar, acredito que cada um tem sua fé, e enquanto fé individual, diz respeito apenas àquela pessoa. Procuro ser o menos etnocentrico possivel. Mas não gosto da teologia da prosperidade, enquanto principio filosófico de fé.
A teologia da prosperidade, para quem não sabe, é o principio no qual se assenta as igrejas neo-pentecostais, tal como a Igreja Universal, do bispo Edir Macedo, e a igreja do R.R.Soares, que sinceramente não lembro o nome. Em sintese, e cito de cabeça pelo que sei, com minhas palavras (provavelmente no papel, na teoria, deve ter nuances diferentes), essa teologia defende que o ser humano, o crente em Deus, deverá ser recompensado em terra pela sua bondade. Recompensado materialmente. Deus é o senhor do mundo, de todas as riquezas, e nós, como seus filhos, temos o direito a usufruir essa riqueza, em vida. Os homens bons e retos de Deus terão sua recompensa (saúde, riqueza, etc) em vida. Não gosto, essencialmente, por corromper toda a idéia básica do cristianismo (não só da igreja católica, mas do cristianismo) de humildade. As pessoas que vão as essas igrejas adotam uma postura "utilitalista" (estou usando a palavra no sentido geral; não o conceito sociológico de utilitalismo, que reconheço não conhecer bem). O que quero dizer: elas esperam uma recompensa. Vão à igreja para fazer pedidos, e esperam ser recompensadas por sua fé. Se devotam à Deus para ter casa, carro, saúde... Chega a ser engraçado ver esses cultos, baseados inteiramente em "pedidos", para que Deus mude suas vidas, etc e tal... raro ver a louvação pela louvação. Então, surge os testemunhos, pessoas que passam pelo palco (palco, é esse mesmo o termo que quero usar) dizendo que Deus mudou suas vidas, que antes não tinham nada, mas agora a empresa está prosperando, o casamento está dando certo, o filho saiu das drogas, conseguiu emprego... Chega a ser uma palhaçada (com todo respeito a quem acredita). Fé verdadeira independe de provas materias e concretas (por que aí é ciencia), e independe de recompensas (por que aí é interesse). Fé, é quando tudo está dando errado e você ainda acredita. E também tem a questão da riqueza material. Não sou teólogo, nem especialista em religião, mas no meu entender, o cristianismo se baseia na humildade, na devoção, e na pobreza. Se em algum momento da biblia (não sei exatamente onde) Deus diz que é mais fácil o camelo passar pelo buraco da agulha do que um rico entrar no céu, e por mais que isso seja uma metáfora, uma parábola, como podem todos os "verdadeiros crentes" querer ser ricos? Raramente citaria um filme para embasar alguma tese minha, mas gosto de "A Última Cruzada", do Spielberg. Lá no final, quando devem adivinhar qual é o cálice sagrado de Jesus, o nazista escolhe o cálice de ouro, cheio de diamantes, que diz ser "digno do filho de Deus", toma e morre. Indiana Jones escolhe o cálice de barro, aburdamente simples, e nele está contida a salvação e a vida eterna. Ou seja, Jesus é humilde, porra!
Outra coisa que não gosto dessas igrejas neopentecostais (procuro deixar no genérico, para não dizer que é preconceito, mas a Universal é a representante-mór dessa corrente que critico) é o espaço que abre para enganações. Enganação dos fiéis, por parte da igreja. Coação psicológica, para que doem dinheiro. Sempre o dinheiro, sempre o material. Minha amiga Julhy fez uma excelente etnografia no ano passado a respeito do tema, para a disciplina de antropologia da Valéria. É um tema muito fértil. Me lembro de que um tempo atrás tinha que fazer hora, para um compromisso, e não tinha o que fazer. Estava passando em frente ali na avenida sete de setembro, e resolvi entrar e ver parte de um culto na igreja Universal, para fazer hora. Me impressionou a desonestidade intelectual (ou pode-se chamar de mentira, mesmo) do pastor lá na frente. Ele estava fazendo campanha política, literalmente. Ah, se a justiça eleitoral soubesse e fizesse algo... Dizia que o senador não-sei-quem era "nosso representante" lá no congresso, que estava lutando pelos interesses da fé de Deus. Em certo momento disse "Ou algum de vocês gostaria de ver o pastor aqui realizando casamento de duas pessoas do mesmo sexo?" E a platéia em unissono "Não!". E começeu a dizer que era para defender a posição da igreja q o senador estava lá em Brasília, por que "eles estão querendo aprovar isso aí, casamento de duas pessoas do mesmo sexo, e se for aprovado, o pastor aqui não vai poder se negar a realizar, por que senão é discriminação (em tom ironico)". Afora o preconceito contido na frase (sobre esse nem vou falar nada, por que um dia ainda vou escrever a respeito do que eu penso sobre o preconceito em si), é intelectualmente desonesto, ou seja, mentiroso. A proposta de lei diz respeito a isso: leis. Se um dia for aprovada essa lei, dirá respeito ao casamento civil. Nenhuma lei pode versar sobre principios de fé ou sobre doutrinas religiosas. Nunca que uma igreja seria obrigada a realizar casamentos gays, se não quisesse, se fosse contra sua doutrina. Provavelmente o pastor sabe disso, mas manipula as palavras, mente, para iludir os fiés, que provavelmente não tem conhecimento sobre leis.
Mais uma coisa que não gosto nessas novas igrejas (já estou falando contra as igrejas em si, não somente contra a doutrina de fé - faço muito isso, me desviar do assunto principal) é sua indefinição quanto à história e personagens e fatos da história. Por exemplo, outro dia estava dando uma lida num livro de Agostinho, sim, Santo Agostinho. Aí pensei, o que diria a respeito a igreja Universal? Elas negam tudo que é próprio da igreja católica, mas existem certos personagens da história que estão intimamente ligados à igreja católica. Santo Agostinho, por exemplo, é apenas mais um. Santo da igreja católica, mas também de extraordinária importancia para a filosofia, construtor  de toda a interpretação biblicia que em parte se têm até hoje. Sinceramente, não sei a posição delas quanto à Agostinho, se é que existe essa posição. Mas você não pode ignorar a história, então acredito ser complicado o sentimento de "novo messias" que tentam criar, como se fossem os salvadores, e os outros todos estivessem errados.
Esses são só alguns dos principais argumentos; poderia escrever bem mais a respeito, mas sinceramente, acho que não vale a pena. Curioso que essa é a única corrente religiosa com a qual tenho certo ressabiamento. Mas que fique bem claro, não gosto do pensamento nem da prática adotada pela igreja, mas nada tenho contra os fiéis. Se você é um deles, respeito plenamente você e seu direito em crer no que quiser. O que é outro ponto contra essas igrejas: estão sempre em luta contra alguém, querendo ser os "certos", negando e criticando outras religiões, como a católica ou a espírita, como se fossem "erradas". Talvez , além de respeito com o outro, lhes falte ler um pouco de Foucault: não existe verdade, apenas discursos de verdade.

2 comentários:

Carlos Pegurski disse...

Concordo com muita coisa do que disse. Nem sei se existe fé em si. Tudo é tão institucionalizado, né? Ótima reflexão.

Carlos Pegurski disse...

Você sabia que as igrejas do fatídico bispo têm metas que, se não cumpridas, causam o fechamento da igreja?

E eu que achava que atirar pedras em vidraças era brincar com coisas sérias demais...