sábado, 10 de julho de 2010

O fim de uma tradição

Desde 1995 eu compro a Revista Set. É uma revista de cinema. Muito provavelmente a mais importante do país. Ou pelo menos era, até agora. Quando mais novo, ficava apreensivo, esperando chegar a edição do mês, para ler e devorar a revista. Já faz uns tempos, com o advento (parênteses: acho muito interessante essa palavra, "advento". Já perceberam como ela está carregada de valorações? Um "advento" é necessariamente algo que traz beneficios... fim do parênteses) da internet, não a leio mais. Por isso, e por sua linha editorial, priorizando blockbusters e afins. Passei a não gostar. Já fazia uns dois anos que não lia, mas continuava comprando. Comprando e guardando. Principalmente, senão unicamente, por tradição. Tenho todas as edições desde 1995. São 15 anos. Tradições assim não se rompem facilmente. Continuando. Fazia já algum tempo que comprava mas não lia, guardava. Ano passado, devido à uma crise financeira e de vendas, que incluiu a falencia da editora e a venda da marca para outra editora, toda a editoria, que já se estabelecera há quase uma década, foi trocada. Todo o processo gerou muitas brigas internas. Muitos leitores não gostaram. Eu vi a mudança como positiva. Por três edições, a revista passou a ser comandada por um novo editor. Durante três edições voltei a ler, pois a revista voltou a ser sobre cinema, verdadeiramente. Infelizmente, ela retornou para as mãos do velho editor, cujo ego se confunde com a revista, como Luis XIV e o seu "o Estado sou eu". O editor temporário, e outros, em cisão, fundaram duas novas revistas, o que foi muito positivo para o público. Em toda essa briga, várias edições da Set foram saltadas, ou seja, em muitos meses não foi publicada a revista. O atraso das edições permaneceu esse ano, e até onde sei, ainda permanece. O fato é que, atrasadas as edições, perdi o costume costumaz de comprar a revista. Mês passado, por esquecimento, foi a primeira edição que deixei de comprar em 15 anos. Percebi que não me importo mais com a revista, que a tradição perdeu seu sentido para mim, ainda que tenha significado muito no passado. Resolvi acabar com essa tradição. Ainda comprarei a Set, muito eventualmente, quando algo me interessar, mas percebi que, assim por um esquecimento, quase organicamente, a tradição havia se acabado. Acho que o primeiro passo para uma tradição morrer, provavelmente, seja ela tornar-se apenas isso, uma tradição desprovida de sentido ou função. A compra da Set havia continuado como tradição, para mim, mas sem função de leitura. Bastou o tempo que essa tradição fosse abandonada.

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