domingo, 8 de novembro de 2009

Desejos e Obrigações

É curioso perceber que a maior parte do tempo que gasto com leituras não tem nada a ver com as supostas obrigações de nenhuma das duas faculdades que faço. Não sei calcular com a precisão peculiar dos engenheiros, mas diria que metade das minhas leituras é de coisas por conta própria, e a outra metade são das duas faculdades somadas. Não que este todo dê muita coisa, mas... Outro dia fui na biblioteca de pós-graduação (na de graduação não tinha) e peguei um livro do Durkheim; fui ler seu estudo sobre o suicídio. Está certo que o tema surgiu (e se foi) em uma comentário en passant durante uma aula, mas nada tem a ver as disciplinas ou mesmo as faculdades que curso. Esse foi um exemplo, assim é com minhas outras leituras.
Nisso, surge a questão da obrigatoriedade da leitura. Há professores que passam uma grande carga de leitura, mas ora, eu não leio e me saio bem nas provas/trabalhos do mesmo modo; de que adianta cobrar uma carga de leitura grande, que por ser grande, não será lida? Falei isso para uma professora, período passado (não sei se convém identificar, e como aprendi que citar nomes em demérito pode gerar confusões, não o farei), e ela não gostou, porém mudou a didática nesse período (não estou dizendo que foi por minha causa, longe disso). O fato é que, como diz o ditado: “se quer fazer com que uma lei não seja cumprida, faça-a rígida demais”. Exigir a leitura de 3 livros é saudável e factível, exigir 10 não é, então, nenhum deles será lido, quando se poderia fazer com que ao menos 3 fossem lidos de fato.
Mas estou me desviando do assunto, quero falar sobre a obrigação em si. Ainda que o texto seja interessante, que em outra oportunidade você até iria a ele espontaneamente, a obrigação de ler já o torna uma outra coisa, diferente da busca autêntica. Acredito que é na busca autêntica que reside a verdadeira produção do conhecimento. Um bom exemplo disso é uma outra professora, que passa as indicações, mas não costuma cobrar ou fiscalizar as leituras, rigidamente. Isso gera como primeiro movimento um desdém, em termos gerais, pela matéria, por ser mais “fácil”, uma vez que não há (tanta) cobrança ou controle. Pode parecer que exista uma queda na produção de conhecimento por causa disso, e talvez haja mesmo naquele conhecimento médio, que todos possuem, sabem mais ou menos do que trata o assunto, mas não muito bem (foi assim que saí da disciplina dos 10 livros, mesmo tendo ficado com nota acima de 9. Nota nada representa). Mas então surge um segundo movimento, que é a verdadeira produção de conhecimento. Por não ser cobrado, o aluno se sentirá livre para não ler o livro, ou para lê-lo, espontaneamente. Nessa espontaneidade está toda a questão. No intervalo, outro dia, comentava-se “Ah, quem vai ler aquele livro?! Não é cobrado mesmo..”, ao que minha amiga Thainá (aqui posso citar o nome, afinal, é um elogio) respondeu “Eu estou lendo; gostei do tema”. Eis o gosto, não a obrigação. Eis de onde surgirá o verdadeiro conhecimento.
Queria viver num mundo utópico, em que todo o modelo de educação pudesse ser baseado nessa liberdade. Ainda escreverei, outro dia, especificamente sobre essa questão dos modelos de educação. Mas infelizmente a sociedade contemporânea não está suficientemente aberta para uma ruptura assim, então ainda há a necessidade da obrigação, ainda há a necessidade da cobrança, mas existe também a necessidade de um equilíbrio entre essas coisas, um equilíbrio entre liberdade e controle, para atingir o objetivo ultimo de uma universidade: conhecimento.
Acabei fazendo um outro texto, que não o que tinha em mente quando comecei a digitar. Minha intenção era apenas dizer: coisas obrigatórias perdem um pouco de seu gosto, mesmo que sejam boas, mas ainda temos que viver com essas obrigações. Já coisas “naturais”, orgânicas, aquilo que partimos em busca, são melhor compreendidas.
Simples assim.