sábado, 18 de setembro de 2010

A negação da parcialidade

Me incomoda muito, muito mesmo, a parcialidade posta como verdade, que não se reconhece como parcial. A parcialidade que critica a outra parcialidade tende a ser ainda mais parcial e tentar se colocar como verdade, não como mais um lado. Tudo bem que todos busquem consolidar seu discurso como verdade (como nos ensina Pechêux e a escola francesa da Análise do Discurso), mas acho que é importante reconhecermos que somos apenas mais um lado. No discurso da igualdade, dos direitos humanos e afins, esse discurso de verdade única pode ser percebido muito bem.
Fim de semana passado (só estou escrevendo agora, eu sei, mas pelo menos estou) pipocou na blogosfera, auto-denominada progressista (não gosto desse termo), como tema uma crítica aos religiosos que se organizaram para fazer lobby para suas propostas e para os candidatos de suas propostas, tais como serem contrários ao aborto e à união homosexual. Alguns desses posts podem ser vistos, aqui (o mais relevante para minha análise de hoje), aqui, aqui, e aqui. O que os evangélicos fizeram foi criticar o PT e pedir que seus fiéis não votassem no PT. Embora eu seja petista, vou aqui defender o lado dos que estão contra o PT.
Ora, é legitimo organizar interesses, e fazer grupos de pressão por esses interesses. É legitimo e em certa medida até positivo. Esta é a lógica do lobby. Melhor feito às claras do que de modos escusos. Se os metalúrgicos têm direito de reivindicar suas pautas, por que os evangélicos não teriam? Ok, vão dizer que a questão se trata do preconceito por detrás das propostas, etc. O que penso sobre isso já escrevi nesse blog. De qualquer forma, eles têm o direito de reinvidicar suas pautas. Se serão efetivadas ou não, é uma questão para se debater no congresso. Mas não podemos, de forma alguma, dizer que eles não tem a priori o direito de defender suas pautas. Ora, pode-se argumentar que eles apresentam os fatos distorcidos. De fato, concordo. Mas é a perspectiva deles. A extrema esquerda também apresenta uma perspectiva que, dizem os capitalistas, é distorcida do sistema. Retorno ao que eu digo: concordemos ou não, atrasadas e retrógadas ou não, eles têm o direito de se organizar para reivindicar suas pautas. Mas a crítica que se faz a esses grupos mostra um ensejo de verdade, como se eles não pudessem pensar de modo diferente. Podem. Afinal, a verdade não existe, não é mesmo? (nossa, sou mesmo um pós-modernista).
E nisso já aproveito para engatar uma crítica ao Lula, que essa semana disse querer "extirpar o DEM da política nacional". Minha crítica não é por quaisquer motivos que surgiram na imprensa, de que o presidente não poderia dizer algo do gênero. Acho que pode. Só não é inteligente desejar isso. Como nos ensina Foucault, quanto mais liberade maior a vigilância. Se você tem um inimigo, não queira o mandar para as sombras, onde não poderá enxergá-lo. Traga-o para a luz, onde possa vigiar. O que quero dizer é que também é legitimo que interesses de extrema-direita sejam representados no congresso e acho saudável que o sejam. Caso não sejam, não morrerão mas ficarão nas sombras, até resurguir com mais força. O correto, portanto, no caso de Lula, é desejar enfraquecê-los, não os destruir. Uma das grandes bobagens da lei brasileira (e em certa medida internacional) é criminalizar o nazismo e proibi-lo. As praticas nazistas, evidentemente, são crimes, mas não se deveria restringir a doutrina filosófica de pensamento nazista. E não digo isso (apenas) por um liberalismo do ato de pensar (no qual acredito e defendo), mas por que, em termos práticos, se o nazismo é proibido, ele vive nas sombras. Não deixa de existir. Ele continua aí, a cada esquina, onde não vemos. Fosse legalizado, se teria controle sobre quantos são e quem são essas pessoas. Mais liberdade, mais vigilância. O mesmo vale para o DEM, para os evangélicos e para quaisquer adversários.

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