Não sei se é comum as procissões em Curitiba. Se não for, é uma grande coincidencia. Por duas vezes já, caminhando pela rua XV ou próximo da catedral de Curitiba, cruzo com procissões. Uma vez, no fim do ano passado. Outra, do fim do último semestre, em junho. Esse é mais um dos textos "em espera", que finalmente resolvi escrever. escrever apenas para tentar, ainda que saiba que serei mal-sucedido, descrever uma das coisas mais bonitas que já vi e presenciei na vida. Fim de tarde, anoitecendo, quase totalmente escuro já. Durante a procissão a noite terminaria de cair. E vejo aquelas velas. Uma multidão de pontos brilhantes, a iluminar as ruas. Cada pessoas, com uma vela na mão. Cantando as canções, puxadas por um mini carro de som. Na frente, o padre conduzindo as pessoas. Cantos de louvor e alegria. É isso que acho bonito na igreja católica: louva-se Deus pois Ele deve ser louvado, e pede-se pelo bem dos outros, pela paz do próximo, diferentemente das igrejas neo-pentencostais, que incita o egoísmo, em que todos apenas procuram a recompensa material de sua fé, pedem mais que louvam e louvam para ter os pedidos aceitos. Continuando com a beleza. As ruas paradas. Era realmente muita gente. Acho que ocupava umas duas quadras, senão mais. Também não fiquei contando. Pelo caminho, carros e motos da polícia fechavam o transito e garantiam o percurso. Os carros e onibus paravam para o caminhar das pessoas. Juntei-se. Não podia ser um simples observador externo. Alguem chega a mim, e oferece-me uma vela. Outro me provê o revestimento, improvisado com uma garrafa de refrigerante recortada. Aceito e carrego também a minha luz acesa. Essa preocupação com o próximo, em lhe oferecer uma de suas velas sobressalentes que não vejo nas pessoas e nos mundo em geral. A procissão caminha, sob o entoar dos cantos, da catedral na Tiradentes, passando pela praça Carlos Gomes, até a igreja do Guadalupe. Entro em paz e compartilho da missa. A imagem dos milhares de pontos brilhantes na noite curitibana não sairá de minha mente. Não tirei fotos, tão absorvido pela situação que nem pensei ou me preocupei com isso. Ainda que tivesse tirado muitas fotos, não adiantaria. Fotos não captam a alma, a atmosfera. a beleza daquela cena estava não apenas em sua deslumbrante composição imagética, mas na atmosfera que havia, o clima, a sensação, a emoção de compartilhar o mesmo amor e celebração por Deus.
sábado, 31 de julho de 2010
sexta-feira, 30 de julho de 2010
Liberdade e escolha (Ou: eu não acredito no demônio)
Hoje o Doug escreveu no twitter "Oh liberdade! Divina liberdade! Quero sair e não me abrem a porta.", que remetia ao clipe de uma música (esta, por curiosidade). Me veio à mente o tema: liberdade. Em que medida somos realmente livres? Bom, talvez esse seja um dos maiores temas filosóficos já levantados e qualquer coisa que eu aqui escreva será pequena. Por isso, nem me alongarei demais. A questão, na qual penso nesse momento no dia de hoje, é: em que medida somos realmente livres para fazer o que queremos ou nossas escolhas não são nossas, mas determinadas por uma série de fatores? Me recordo muito das aulas de psicologia, semestre passado. Segundo algumas perspectivas (sobretudo em Freud) nossas escolhas, ou o que pensamos ser nossas escolhas, não são nossas, mas fruto de nosso inconsciente. Aquilo que você racionalmente pensa que decidiu e escolheu é fruto é uma determinação inconsciente. Eu, em certa medida e resguardados limites, acredito nisso. Mas então vem a questão: não somos livres então? Bom, talvez não. Se pensarmos, já começa pelo "quem somos". Não somos um receptáculo vazio, que pode tornar-se qualquer coisa. Partimos de pressupostos, de onde nascemos, como fomos educados, enfim, quem somos. Eu não escolhi ser paranaense de classe média. Minha mentalidade foi construida a partir dos pressupostos dessa cultura, e mesmo que eu me relativize, não posso escolher ter a mentalidade de um carioca ou paulista da periferia, por exemplo. A partir do momento que fui criado numa cultura enxergo os olhos a partir dela, e minhas escolhas são determinadas por isso. São realmente escolhas? Minhas escolhas advém de minha vida, que em boa parte não é escolha minha. Sou cristão e acredito nos pressupostos cristãos. Assim sendo, quero acreditar na liberdade e na escolha. Eu acredito na liberdade e na escolha. Por isso, sempre digo que não acredito na existencia do demônio. Pelo menos não tal como usualmente formulada. Sabe, gosto desse tema/problemática. Vez por outra, retorno a ele. Às vezes, do nada, viro para algum amigo e pergunto: "você acredita no diabo?" Chega a ser engraçado. Eu até acredito no diabo como senhor do inferno, lugar de punição pelas suas escolhas, no pós-morte. Ou, numa perspectiva que acho muito bonita, o diabo apenas como o acusador, aquele que reune as informações ruins sobre você, tal como um promotor, para apresentar diante do juiz, Deus. Então, o ser humano, tal como é comum no preso que se revolta contra o advogado ou o promotor, julga seu acusador como responsável por sua pena, quando ele próprio é o culpado. Vez por outra, principalmente agora nas férias, com tempo sobrando, ao zapear os canais, acabo de deparando com programas religiosos na TV. Me causa estranhamento ouvir pastores e fiéis falando coisas sobre como o diabo está interferindo na vida das pessoas, como está lhes causando mal, como a fé vai afastar o mal e melhorar a vida, etecetera e talz. Penso que a existencia de um diabo que tenha poderes quaisquer de interferir na vida das pessoas simplesmente contraria toda da filosofia de liberdade e escolha, o livre arbítrio, existente no cristianismo. Se é o diabo que está interferindo na minha vida, se é ele o responsável pelas coisas ruins que sucedem, onde está a possibilidade de livre-arbítrio? Isso livra de responsabilidade o individuo, de responsabilizar-se por suas ações e as consequencias delas. Com isso, perde-se a liberdade e a escolha. Por crer que o ser humano fundamenta-se em escolhas, e que são essas escolhas que, formando seu caráter e suas atitudes, dirão quem é você, que eu não acredito no demônio. O leitor atento poderá perceber algumas contradições em minha fala. De fato, elas estão presentes e são ainda mais acentuadas do que expus aqui, mas não me proponho a ter uma responta pronta para isso. Se milênios de filosofia não responderam isso, como posso ter algo concluido? Pelo menos, não por enquanto. Apenas me proponho a refletir sobre essas questões.
quinta-feira, 29 de julho de 2010
Carta a C.D.
Ontem tive uma notícia (acadêmica) um tanto desagradável, embora ainda não confirmada. A C. talvez substitua o A. como professor das aulas de Linguagem Visual 2. Eu já conheci muitos, muitos professores ruins, péssimos em minha vida. Mesmo assim, a C. é muito provavelmente uma das piores professoras que já conheci. Em vista de algo tão desagradável, que é saber que terei que suportar sua má-qualidade (ia usar a palavra mediocridade, mas ela não chega a tanto) por mais um semestre e logo numa matéria que gosto, acho válido e justo publicar aqui o que penso sobre ela. Não estou falando pelas costas. Segue abaixo, cópia do e-mail que enviei a ela, algumas semenas atrás, alguns dias depois de acabado o semestre passado. Cheguei a pensar em publicar, à época. Depois deixei de lado, se tratava de uma questão pessoal, e o melhor seria deixá-la no passado. Mas já que ela retornou, acho conveniente me expressar. Sintetiza um pouco o que penso a respeito.
*****
Olá, C.,
Ao fim de todo semestre, costumo fazer uma avaliação íntima, pessoal, dos meus professores e do que foi e representou o processo pedagógico de aprendizado no semestre que se finda. Tenho especial atenção a este processo, pois me interesso pelo ambiente acadêmico e, havendo a possibilidade de ocupar o outro lado futuramente, dar aulas, atento-me sobre os processos didáticos e como se processam os aprendizados nas diferentes cognições que cada um de nós temos. Quando vejo que, determinado processo teve algo relevante, seja positiva ou negativamente, gosto de me expressar. Mas não gosto do sistema eletrônico de avaliação do professor disponibilizado pela universidade. Não acredito nele, por uma série de motivos que não são o tema deste escrito. Gosto de escrever diretamente para a pessoa envolvida. Assim, ao fim de todo semestre me ponho a escrever aos professores, às vezes pontuando o quanto foi proveitoso, às vezes tecendo críticas e indicando caminhos a aprimorar. As aulas de Editoração Gráfica 2, como todos chamam a disciplina (oficialmente, no currículo, a disciplina chama-se Editoração Eletrônica: Editoração Gráfica), ministradas por você, C., me inspiraram a escrever mais uma carta de final de semestre. Esta. Evidentemente, tudo que digo diz respeito à minha perspectiva, que possivelmente seja diferente da de outros de meus colegas.
Uma primeira questão diz respeito às qualificações. Ninguém questiona suas qualificações enquanto designer formada, preparada. Mas o que se averigua, na prática, pelo menos na minha perspectiva, é diferente. Questionada sobre algo, você se senta ao computador, e vai mexendo no programa, longamente, como que para descobrir. Veja, não é o aluno que vai mexendo, para aprender, mas você que vai mexendo, para descobrir (o que é outro ponto questionável: fazer para demonstrar, no lugar de orientar oralmente para que o aluno faça). “Ah, esses programas mudam tanto...”, é uma frase dita mais de uma vez por você. O professor tem que ter o domínio sobre o conteúdo ministrado. O que não significa assumir uma posição de onisciente, que tudo sabe; evidentemente existem limitações e é salutar assumi-las. Mas sobre o conteúdo mínimo, há sim, que se ter domínio. Os melhores professores sabem de memória e versam a respeito dos conteúdos que ministram. Seu objeto de estudo é prático, não teórico, e também deveria saber este de memória. A hesitação, que repetidas vezes, demonstra, gera insegurança no aluno. Ainda é uma atitude melhor do que reprimir perguntas, mas não é a melhor das atitudes a serem tomadas. O melhor seria saber e ter domínio sobre o que se ensina.
Veja, você é simpática. Sim, muito. Extremamente simpática. Tanto que eu, que procuro não me deixar envolver por tais seduções, muitas vezes não disse o que pensava para não "desagradar". Se comigo foi assim, imagine com outros, que consideram a "amizade" e a "simpatia" elementos básicos necessários... Mas esta não é a função do professor. Me pergunto: de que adianta eu deixar de falar que não gostei, para não desagradar? Vai te aprimorar, fazê-la melhor? Não. Portanto, usar a simpatia para ocultar e afastar as críticas também não é uma atitude correta a se tomar, ainda que tenha sido tomada em nível inconsciente, não-proposital. Esta é uma questão essencial. O professor não tem que ser simpático nem amigo. Isso não significa se afastar, não ser cordial, tratar mal. De forma alguma, pois se isso ocorresse faria mal igual. Mas amigo e professor tem funções diferentes. O amigo está ali para te apoiar, mesmo sabendo do seu erro. O professor deve implacavelmente apontar o erro, para você mudar. Amigo não muda nem forma estruturas cognitivas, para usar um termo da área. Isso é dever do professor. E ele não pode fazê-lo sendo amigo, passando a mão na cabeça.
Por diversas vezes, você repetiu frases tais como “Depois vocês vão chegar no mercado, e vão se dar mal” ou “Eu vou passar vocês agora, e depois o mercado vai selecionar”. Você demonstra uma atenção excessiva ao mercado, típica de quem não tem formação em uma área de educação (tratarei disso adiante). Valendo sua opinião, o mercado se encarregaria de tudo, das notas, das aprovações... Se há tanto mercado, para que estamos na universidade? Vou dizer: o mercado não existe. O mercado não interessa. Por mais que alunos (há pouco você também era uma aluna), ávidos pelo trabalho qualificado, queriam acreditar que sim, a universidade não se reporta ao mercado. Não é seu papel, no tocante a filosofia da educação. O papel da universidade é a construção do saber. Ponto. E isso vale também para os cursos de tecnologia, a saber.
Outra coisa que, por diversas vezes, e repetidas vezes, você disse é a respeito da pertinência da disciplina na grade curricular de nosso curso. Você acredita, palavras suas, que ela não deveria existir ou pelo menos ser optativa. Que, em sendo uma coisa que nem todos gostam ou tem aptidão, você não pode cobrar isso dos alunos. Novamente palavras suas. Aqui se tem uma série de equívocos. Primeiro. É bem evidente seu sentimento de corporativismo junto ao design. Você é da área do design, e acredita que estamos roubando o espaço de sua área. Diversas vezes disse coisas como “isso se aprende em 4 anos no design, como vou ensinar em um semestre?” ou “No design, existe uma disciplina inteira só pra esse item X. Vocês não têm como aprender, vocês não vão aprender”. Com isso, determina previamente que não vamos aprender, que não podemos aprender, ou aprender bem. Fica bem evidente seu pré-determinismo, antes mesmo de começar as aulas, não? Você tenta defender sua área, mas se esquece que design, assim como a comunicação, não é ciência e qualquer idiota faz. E isso é verdade. Lamento o linguajar, mas é necessário. Não se faz medicina ou engenharia sem estudo e fundamentação, assim como também não se faz sociologia ou filosofia sem isso. Mas mesmo a comunicação, não requer fundamentação para ser feita, assim como o design também não. Todas as teorias que tivemos de comunicação serviram sim, e ajudam, como um lastro para a prática, mas alguém que nunca ouviu falar de Kunsh, Teobaldo, Adorno, Habermas, Barbero e tantos outros pode eventualmente fazer comunicação muito melhor. Assim como saber tipografia é um lastro que ajuda, mas alguém criativo, sem nunca sequer ter ouvido falar nisso, pode fazer design muito melhor do quem sabe isso. Mas é como se dissesse "vocês não são nem podem aprender design, por que não fazem esse curso". Então surge uma questão fundamental: se você não acredita na disciplina, como ministrá-la? Ou como pode ministrá-la bem? Nunca, jamais, se ensina, ou se ensina bem, aquilo em que não se acredita. O professor tem que ter paixão em dar aula, e acreditar naquilo. Se não tiver isso, não tem nada. Não há nada pior do que um professor sem paixão. Isso se nota claramente. Você não acredita na disciplina, e não a ensina bem. Nem poderia.
O segundo equivoco é referente à cobrança. Você já disse coisas como "em questão gráfica, eu não posso avaliar vocês, pois vocês não têm esse domínio". Ora, se você não vai avaliar em questão gráfica vai avaliar em quê? Um curso superior pressupõe, sim, avaliação, goste ou não o aluno da matéria. Com todo respeito, mas nós não temos o domínio por que você não ensina. Se ensinasse, talvez tivéssemos. É seu dever ensinar e cobrar, sim, que tenhamos esse domínio. Isso é reflexo do seu “corporativismo”, de achar que só se pode fazer design os que cursam design. Para se ver o quão esdrúxula é essa afirmação, é como se o professor de psicologia dissesse que não pode nos avaliar em relação à psicologia, pois nós não somos psicólogos. Ora, justamente por isso temos uma matéria de psicologia, para aprender o essencial dessa área à comunicação, senão não precisaríamos dela. Fossemos designers não precisaríamos disso também, mas ao contrário, você não ensina o essencial de sua área a nós.
Um outro ponto que acredito ser grave refere-se à chamada profecia auto-realizável. O que significa isso? O professor acredita que o aluno será ruim. Acreditando que o aluno será ruim, ele o torna ruim. Nas suas aulas, pelo menos a partir de minha percepção, você sempre dá mais atenção a uns do que a outros. Sendo uma matéria prática, onde se tem que aprender a lidar com softwares de computador, isso é fundamental. Mas você dá mais atenção aos que se interessam e se dedicam mais. Poderia-se considerar isso natural, não? Aqueles que se interessam e buscam mais, têm mais atenção. Pois digo que deveria ser o oposto. Você diz que o aluno deve mostrar interesse e se motivar. Uns gostam da área, outros não, e você não pode fazer nada sobre isso. Palavras suas. Uma visão, novamente, liberal, ou liberalizante, do ensino. Ou seja, o ensino livre, como cada um o queira fazer, algo próprio do mercado. Isso não é ensino, para a filosofia da educação. É dever do professor motivar. Ora, dar mais atenção aos que se interessam mais apenas reproduz a lógica que já está posta. Aqueles que gostam, você dá atenção (exemplo máximo, o dia que adiou o conteúdo da primeira aula, esperando uma aluna, não é preciso citar nomes, que só chegaria na segunda aula, por que você queria que ela visse o conteúdo, pois ela se interessava!), ignorando aqueles que não gostam, a quem realmente deveria voltar suas atenções.
Boa parte das críticas que fiz, creio, sejam fruto da falta de formação como professor. Há pouco você era aluna, e embora existam em nosso curso bons exemplos de professores estreantes que tiveram postura exemplar de ensino, você não é uma delas. Pessoalmente, acredito que seja necessário para a prática do ensino esse tipo de formação, mas não nego que possam existir grandes mestres sem essa formação. Infelizmente, no seu caso, isso demonstra fazer falta, como em questões de didática, referente ao como ensinar, que é lamentável, para dizer o mínimo. Para pesquisar um tutorial de como fazer algo no Google, eu faço em casa. Professor não é para tirar dúvidas, mas, como já disse, suscitar o desejo pela matéria e discipliná-lo (daí a origem de “disciplina”) cobrando o aprendizado. Sim, essa é uma perspectiva teórica à qual me filio. Existem outras. O triste é que eu sei disso, mas você não, entende? E que diferença vai fazer conhecer perspectivas teóricas em educação para você, pode-se perguntar? Faz diferença, acredite.
Para finalizar quero contar de quando me interessei pelo curso. Olhei a grande do curso na internet, e uma das disciplinas pelas quais mais me interessei foi justamente a parte de “editoração gráfica”. Eu gostava dessa área. Agora não mais. Dentro da psicologia da educação aprendemos, na ótica do behaviorismo de Skinner, que o aluno associa a matéria ao professor. É o professor que faz ele gostar ou não da matéria. Quando entrei no curso gostava de editoração, mas hoje já não tenho tanto interesse pela área. Claro que isso é fruto de uma série de mudanças, mas em parte creio que você seja a responsável. Não digo isso com ressentimento algum, pois eu sou o responsável pelas minhas escolhas e gosto delas. Talvez um dia volte a me interessar pela área. Apenas digo isso pois deve ser dito a bem da verdade. É preciso que digamos as coisas. Na sociologia também aprendemos que todo conceito é relacional, ou seja, é definido a partir de uma relação. O pai só existe pois existe o filho, assim como o aluno e o professor. Mas, ao contrário do que se pensa, a legitimação dessa relação é fruto de definição e reconhecimento mútuo. Quando o filho renega o pai, este deixa de sê-lo. Para mim, a palavra professor sempre teve um peso e um significado muito grande, de importância e reconhecimento. E pela importância que esta palavra tem, apenas gostaria de lhe dizer que você não é professora. Para mim, eu não lhe reconheço como tal. Pelo menos não é isso que você foi, e não é isso que lhe considero. Espero que um dia possa realmente merecer ser chamada assim, pelo bem de seus futuros alunos.
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Edição posterior, 08 de abril de 2011:
Direito de resposta. E-mail recebido, hoje:
Prezado Márcio,
Entro em contato porque a pouco tempo tomei conhecimento da publicação do e-mail enviado para mim em seu blog. Primeiramente, quero dizer que respeito o seu direito de expressar sua opinião, porém na época não respondi o e-mail por acreditar que este veículo não é o mais adequado para discutirmos tais assuntos.
No entanto, sempre cumpri meus horários de permanência na instutuição de ensino para esclarecer dúvidas das disciplinas que ministrei, bem como qualquer assunto (avaliação, metodologia de ensino, conteúdo, abordagens, relacionamento professor-aluno, entre tantos outros). Tais horários estavam a disposição dos alunos no site e na secretaria do departamento.
Em sala de aula, também sempre fui uma pessoa acessível e dei abertura aos alunos para colocarem suas sugestões, contribuições, críticas e qualquer assunto pertinente a disciplina e a minha pessoa.
Mesmo assim, estou a sua disposição para qualquer esclarecimento pessoalmente. Para tanto, peço a gentileza que retire este texto do seu blog.
Atenciosamente,
C.D.
Os nomes, aqui originalmente encontrados, já não se encontram, tendo sido substituídos por siglas. Não são necessários, por uma questão, com a qual concordo, de respeito à imagem do outro.
quarta-feira, 28 de julho de 2010
Sobre o casamento gay
Semana passada foi aprovada na Argentina a lei que permite o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo. O tema foi matéria de vários jornais e no Brasil movimentos lutam por lei semelhante. Não entendo, realmente, por que tanta polêmica a respeito disso. O que penso sobre o assunto, para mim, parece tão claro, que mesmo sempre procurando me relativizar, não posso deixar de dizer que é a posição correta, verdadeira. O que todos deviam enxergar. E o que penso a respeito?
Se me perguntagem, respondei com a pergunta "Para quem você está perguntando?". Veja, existem muitos eus, existem muitos Márcios. Faço sempre o esforço de tentar separá-los. Me lembro de uma aula sobre Festinger em psicologia da comunicação em que, analisando o case da "petrobrax", defendi para o Zama, o professor, que a opinião do Fernando Henrique intelectual não afetava a opinião do Fernando Henrique presidente. Ele discordou da minha metodologia de dividi-lo em duas pessoas, mas sei de correntes teóricas que refedendam isso que digo, ainda que não saiba fundamentar isso hoje. Penso que não somos uma massa única de opinião. Nós somos cidadãos, somos trabalhadores, somos filhos, pais, conjunges, somos fiéis, somos amigos, somos consumidores e produtores, entre tantas outras esferas de nossas vidas. Em cada um desses momentos nós temos determinada opinião, e, creio, elas podem ser, sim, contraditórias. O que quero dizer com isso e onde quero chegar? Ora, o exercicio de relativizar-se exige que enxergemos pela ótica do outro. Sejamos objetivos, para não perder o foco. Acredito no catolicismo, apesar de não sê-lo (longa história, fica para outro dia). Sou cristão. Ainda que não fosse, teria a mesma opinião.
Penso que as igrejas não devem aceitar o casamento gay. Elas têm esse direito. Faz parte de sua epistemologia e de sua crença. Qualquer crença tem o direito de estabelecer seus critérios internos de fé. No Islã, o homem pode ter até quatro esposas. No ocidente, apenas uma. Acaso as religiões ocidentais estão sendo preconceituosas com os homens que querem mais de uma esposa? Claro que não. Elas estabeleceram que, para elas, um homem pode ter apenas uma esposa. Elas têm esse direito, assim como o Islãmismo tem o direito de estabelecer suas regras de crença. Portanto, as religiões tem o absoluto e intocável direito de estabelecer que uma união correta é entre um homem e uma mulher, ou entre um homem e quatro mulheres, no caso do islamismo, e não entre homens e homens ou mulheres e mulheres. É direito deles. Intocável e inquestionável. Argumenta-se que as igrejas deviam se adequar aos novos tempos, modernizar-se. Ora, Igreja e fé não são o Estado. O Estado, sim, têm que modernizar-se, acompanhar as mudanças da sociedade. Não a Igreja. A fé não muda. As igrejas que cairem nessa armadilha estarão dando um passo adiante em direção à sua extinção. A fé é perene. Ou vamos querer adaptar as palavras de nossos Deuses (seja Jeová, seja Alá) para os dias atuais? Isso não faz sentido algum, pois se estaria abrindo mão de principios, distorcendo questões estabelecidas e criando, na prática, religiões diferentes daquelas que o são, em essência. Para mim, as religiões já estão modernas demais. Por isso acredito e defendo que as igrejas não devem permitir, nunca, o casamento gay.
Então eu sou contra o casamento gay? De forma alguma. Sou absolutamente a favor. Veja, até agora estava tratando sobre igrejas e seu direito inalielável de ter seus próprios preconceitos e exclusões. É um direito. Mas defendo plenamente o casamento gay (ou homo-afetivo, ou seja qual for a nomenclatura politicamente correta a ser usada) civil. E é nesse ponto que a coisa, para mim, parece tão clara que não vejo como alguém pode discordar ou pensar diferente. Desde há muito, em Montesquieu, Estado e Igreja são separados. Reconheçamos que, mesmo depois, a Igreja ainda influenciou muito as decisões de Estado, até o inicio do século XX. No entanto, hoje, isso já está superado. O Estado brasileiro, como a maioria dos Estados ocidentais, é laico, ou seja, não têm nem se filia a nenhuma religião. Portanto, os pressupostos teológicos de quaisquer religião não podem interferir nas diretrizes do Estado. Assim sendo, o que impediria o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo? Absolutamente nada. Mas quando digo isso, que se frise, absolutamente nada mesmo. Todos podemos ter nossas opiniões pessoais, gostar ou não, mas quando falamos de Estado, estamos falando do ente maior de nossas vidas, que deve regular nossos comportamentos. Para o Estado, todos somos cidadãos, não importa de que sexo, e o casamento é a união de dois cidadãos que assim desejam fazê-lo, não importa, para o Estado, se um homem com uma mulher, dois homens ou duas mulheres. Simples assim. Não há argumento contra. Então pergunto: por que já não é assim? Ora, não sei. Sei que deveria ser. E por isso acredito que eu seria um bom político, pois sei me relativizar, colocar de lado minhas crenças, me separar em vários eus. Ainda que meu eu religioso seja contra, meu eu estatal reconhece que este é um direito dos cidadãos, simples assim. Eu votaria a favor do casamento civil para pessoas do mesmo sexo. É seu direito, como cidadãos. Por isso, eu apoio esta causa.
terça-feira, 27 de julho de 2010
A argumentação de Lúcifer
Final do filme "Advogado do Diabo". Sempre achei incrivel essa cena. Esta é a argumentação de Lúcifer (baseada nos argumentos do escritor John Milton, descobri agora) contra Deus, na voz do excepcional Al Pacino. O vídeo é relativamente longuinho (uns 8 minutos) mas são os dois primeiros que importam, e contém a argumentação. Infelizmente, está sem legendas, por isso transcrevo abaixo. Ressalte-se, não é isso que penso. Eu discordo. Eu creio em Deus. Então por que publicar algo que você não concorda?, poderão perguntar. Ora, primeiro, que a argumentação é boa, não importa se eu concordo ou não. Segundo, por que não sou um babaca que só se importa com aquilo com que concorda. tenho abertura e puralidade (ou desejo ter) suficiente para aceitar o contraditório. Sempre gostei da antitese e acho ela fundamental. Ou seja, mesmo que eu não concorde, aqui há espaço. E terceiro, a despeito de tudo isso, é cinema de primeira, muito bem escrito e interpretado. Confiram.
Por quem carrega todos esses tijolos?
Deus? É isso? Deus?
Então, deixe-me lhe dar uma pequena informação especial sobre Deus.
Deus gosta de observar.
É um brincalhão.
Pense nisso.
Ele dá ao homem os instintos mais incontroláveis.
Dá esse dom extraordinário e depois o que faz?
Para Seu prazer pessoal, numa cósmica, particular sessão de risadas. Isso eu garanto!
Ele estabelece as regras por contraste.
É a maior traquinice de todos os tempos.
Vejam, mas não toquem.
Toquem, mas não provem.
Provem, mas não engulam.
E enquanto voces andam as voltas com isto, o que faz Ele?
com isto, o que faz Ele?
Se rola de tanto rir!
É um sujeito gozador! Um sádico
Um desleixado síndico!
Adorar aquilo? Nunca!
[...]
Estou enfiado nisto até ao pescoço desde o princípio.
Alimentei todas as sensações que ao homem possa ter!
Preocupei-me com o que ele desejava sem nunca o julgar!
Por que? Porque nunca o rejeitei, apesar das suas imperfeições!
Sou seu admirador!
Sou um humanista. Talvez o último.
Quem, no seu perfeito juízo, pode negar que o século XX, foi inteiro meu?
Todo ele! Por completo. Meu.
- Na Bíblia, voce perde. Estamos destinados a perder, pai.
- Leve em conta a fonte, filho.
Simples assim, com uma frase, e ele desqualifica toda a biblia. "Leve em conta o autor". Ou seja, a biblia é escrita a partir de um ponto de vista e obviamente vai defendê-lo. Incrivel argumentação. Não concordo. Continuo com minha fé, e realmente acredito que a biblia seja a verdade, independentemente do autor. Mas isso faz pensar, não?
segunda-feira, 26 de julho de 2010
Burrice extrema ou pura má-fé
Era esse o título do post que havia começado há muito tempo, deixado nos rascunhos sem acabar e que iria terminar agora. O texto era absurdamente longo, talvez o maior que já tenha escrito para este blog. Não sei o que fiz, o que cliquei, mas o texto se apagou. Sumiu. Puft. Sim, escrevo diretamente no campo do blog, e não tenho backup. Tentei resgatá-lo, mas não consegui. Estou pasmo, sem acreditar nisso. Infelizmente, se perdeu. Não vou re-escrevê-lo. E pior que tava bom, hein? Narrava minha revolta e indignação com o que chamei de uma das mais nonsenses peças já produzidas pelo nosso judiciário. Comecava contando da notícia que soube, no blog do Josisas de Souza, que o Ministério Público Eleitoral estava pedindo a retirada do ar do blog "Os amigos do presidente Lula". Então eu peguei a peça de acusação e desfiz seus argumentos, um a um. A peça é absurda e ridícula, daí o titulo: burrice extrema ou pura má-fé. Distrocia conceitos de forma clara, apresentando o blog como propaganda quando esse, o blog, não tem vinculo institucional. Falava em evitar o uso o poder economico, quando isso é impensável na internet, em que todos são iguais. Apresentava como provas da propaganda citações absurdas e descontextualizadas, que não se classificam assim de forma alguma, são apenas opinióes tão válidas quanto aos dos sociólogos. Texto bonito, o meu. Perdeu-se. Em tempo, a açao foi rejeita pelo TSE hoje.
Na ausência de palavras, a música
Na ausência de palavras a serem ditas, eis o som, a música para ocupar nossas vidas. Eis algumas das que eu gosto.
Esse clipe foi feito a partir de um dos melhores episódios de Doctor Who. Adoro a série e adoro o clipe.
Não conheço essa banda. Achei por acaso o clipe e gostei muito. O som, mas principalmente as imagens. Gosto desse estilo de filmagem.
Madredeus. Acho que não preciso falar mais nada. Lindo.
E por fim, com 1:13 (um minuto e treze segundos) desse video, quando a loira começa a cantar, é uma das coisas mais lindas que já ouvi na minha vida. Sobem calafrios pela minha esfinha. É divino.
Enjoy ;)
domingo, 25 de julho de 2010
sábado, 24 de julho de 2010
Lição?
Citação:
"O gestor público deve sempre atuar nos limites da legalidade, deve explorar suas fronteiras. As regras formais são burras. Tolo é aquele que respeito esses limites, pois o outro, seu adversário, não respeitará. Devemos transigir essas fronteiras, pois se não transigirmos, não iremos nunca estabalecer novos limites, e sem isso, não mudaremos nada na sociedade."
Já faz algum tempo que ouvi essa importante lição na faculdade. Ainda não sei se concordo ou não.
terça-feira, 20 de julho de 2010
Apenas mais um dia desperdiçado
Tenho escrito tão pouco, não é mesmo? Principalmente por ser uma época que, em tese, tenho tempo à vontade para escrever... É verdade que tempo eu tenho, mas falta vontade. Nada tenho feito esses dias, exceto desperdiçar os dias de minha vida em um vazio, em um nada. Este é apenas mais um desses dias desperdiçados. Minhas férias nunca rendem, nunca faço nada, e por isso prefiro os tempos de não-férias. Fico pensando o que farei nas próximas férias, quando efetivamente não houver retorno às aulas no semestre seguinte, visto que o próximo é o último... Enfim, passando apenas para atualizar esse espaço, ainda que seja com o nada.
quinta-feira, 15 de julho de 2010
O Nei fez eu me lembrar de Eça
Outro dia, o Nei publicou no seu blog, disponível aqui, um post chamado "Nada a Desejar". Muito bom post, me lembrou de algumas coisas. As coisas que me vieram a mente pouco têm a ver com o post do Nei, mas sabe quando uma coisa puxa outra que puxa outra, num fluxo? Pois é. Me lembrei d'Os Maias, de Eça de Queiroz. Mais especificamente de seu epílogo, o final. Sempre amei essa cena. Me lembro (em termos gerais) de cabeça, mas peguei o livro na estante, para não cometer nenhuma impropriedade. Passada toda a tragédia, os amigos Ega e Carlos Eduardo caminham pela cidade, refletindo sobre a vida, e concordam em ter encontrado a teoria definitiva sobre a vida. Recortei o principal para vocês; vale a pena ler:
Nada desejar e nada recear... Não se abandonar a uma esperança - nem a um desapontamento. Tudo aceitar, o que vem e o que foge, com a tranquilidade com que se acolhem as naturais mudanças de dias agrestes e de dias suaves. E, nesta placidez, deixar esse pedaço de matéria organizada, que se chama o Eu, ir-se deteriorando e decompondo até reentrar e se perder no infinito Universo... Sobretudo não ter apetites. E, mais que tudo, não ter contrariedades.
[...] Do que ele principalmente se convencera, nesses estreitos anos de vida, era da inutilidade do todo o esforço. Não valia a pena dar um passo para alcançar coisa alguma na terra - porque tudo se resolve, como já ensinara o sábio do Eclesiastes, em desilusão e poeira.
- Se me dissessem que ali em baixo estava uma fortuna, à minha espera, para ser minha se eu para lá corresse, eu não apressava o passo... Não! Não saia deste passinho lento, prudente, correcto, seguro, que é o único que se deve ter na vida.
[...] E ambos retardaram o passo, descendo para a rampa de Santos, como se aquele fosse em verdade o caminho da vida, onde eles, certos de só encontrar ao fim desilusão e poeira, não devessem jamais avançar senão com lentidão e desdém.
[...] Então Carlos, até aí esquecido em memórias do passado e síntese da existência, pareceu ter inesperadamente consciência da noite que caíra, dos candeeiros acesos. A um bico de gás tirou o relógio. Eram seis e um quarto!
- Oh, diabo! [...] Não aparecer por aí uma tipóia!...
- Espera! exclamou Ega. Lá vem um "Americano", ainda o apanhamos.
- Ainda o apanhamos!
Os dois amigos lançaram o passo, largamente. E Carlos, que arrojara o charuto, ia dizendo na aragem fina e fria que lhes cortava a face:
- Ao menos assentamos a teoria definitiva da existência. Com efeito, não vale a pena fazer um esforço, correr com ânsia para coisa alguma...
Ega, ao lado, ajuntava, ofegante, atirando as pernas magras:
- Nem para o amor, nem para a gloria, nem para o dinheiro, nem para o poder...
A lanterna vermelha do "Americano", ao longe, no escuro, parara. E foi em Carlos e em João da Ega uma esperança, outro esforço:
- Ainda o apanhamos!
- Ainda o apanhamos!
De novo a lanterna deslizou, e fugiu. Então, para apanhar o "Americano", os dois amigos romperam a correr desesperadamente pela rampa de Santos e pelo Aterro, sob a primeira claridade do luar que subia.
É triste e é bonito. Da vida nada a desejar, pois só há desilução e poeira. Me lembrei agora de Zeca Pagodinho e seu "deixa a vida me levar". Acho que é o mesmo pensamento. O mais interessante do trecho é que os personagens fazem o oposto daquilo que advogam na filosofia. Enquanto dizem não valer a pena correr por nada nessa vida, lançam-se correndo desesperados atrás do "americano", o trem. É o recado de Eça de que há coisas, sim, pelas quais se vale correr.
Eu acho essa passagem extremamente bonita, mas não concordo inteiramente com ela (não preciso concordar, para admirar). Acho sim, que a vida é mais leve quando nada esperamos ou desejamos, mas, assim como Carlos e Ega que correm atrás do trem, também há coisas com as quais devemos continuar desejando. Eu diria que, no fim, além de desilusão e poeira, ao menos restam belas palavras, como a poesia de Eça. Como sabemos, a beleza de belas palavras é a única coisa que tenta competir com a beleza das mulheres.
terça-feira, 13 de julho de 2010
Filmes!
É férias, e evidentemente, tenho assistido muitos, muitos filmes. 2 ou 3 por dia, e isso não é exagero. Muitas reprises, pois gosto de rever filmes que gosto. Outros filmes que tinha visto há muito, muito tempo, e já não me lembrava de nada. Alguns inéditos.
Fazia tempo que eu havia baixado um filme espanhol chamado "Eloise". Finalmente assisti. Achei razoavelmente bom. A grosso modo, conta a história de duas meninas que se apaixonam. Um pouco moderninho demais pro meu gosto, com muita nudez (mais material para minha futura tese!). Achei interessante a narrativa. Existem, desde o começo, três linhas temporais. O "futuro", com a moça internado num hospital, a partir de onde se começa a contar a história; a linha principal, o presente, onde se dá o desenrolar da trama; e ainda fragmentos do passado, lembranças da infância da personagem. O interessante é que não se usa recursos de montagem, como fades ou recursos de iluminação e fotografia, ou quaisquer outros, para indicar a diferenciação das linhas temporais. As cenas simplesmente mudam, abruptamente. Simples assim, e tudo se mistura. O diretor teve muita, muita coragem em fazer isso, pois o risco do público se perder entre as cenas não-lineares era grande. E sabe o mais legal? As linhas temporais são perfeitamente compreensíveis (ao menos pra mim), e em nenhum momento se confundem. Creio ser um ponto positivo tanto do roteiro, ao esquematizar as cenas, quanto da direção e edição. Realmente gostei muito de como esse recurso foi aplicado.
Outro, dos muitos filmes que tenho visto, foi "Uma Noite Fora de Série" (Date Night, no original). Fazia tempo que queria ver este filme, desde que lançou no cinema, mas acabei não indo. Ele simplesmente reúne as duas grandes estrelas da comédia dos dias atuais. Steve Carrell, astro da série The Office, e Tina Fey, protagonista da série 30 Rock. No filme, eles são um casal tentando re-ascender o casamento, com um jantar especial à noite. Sem reservas no badalado restaurante, eles assumem a identidade de outro casal para pegar a reserva deles. Acontece que o outro casal estava sendo perseguido por bandidos, que passam a perseguir eles, numa trama que envolve máfia, policiais, e tudo o que mais a que se tem direito. É uma excelente comédia, não rasgada, nem piegas, mas na medida exata. Frisem minha frase seguinte: é um filme de sessão da tarde. Parecia que eu estava assistindo a sessão da tarde, quando criança. O filme está fadado a isso. Ele já nasceu para ser um clássio absoluto e extremo das futuras sessões da tarde. E isso é um grande elogio. A cena envolvendo um carro chique (não sei de marcas) e um taxi, enganchados, é prova disso. Todo o resto do filme também. Eu adoro sessões da tarde. Adorava quando criança. E agora pude testemunhar o nascimento do filme que vai representar a sessão da tarde para as futuras gerações, assim como eu também tenho os filmes dos anos 80 e 90 que representam a sessão da tarde para mim, mas não mais para as crianças de hoje. É algo realmente gostoso.
O terceiro e último filme que quero comentar hoje é uma das muitas reprises que tenho re-visto. É "Intrigas de Estado" (o título original, "State of Play" é muito melhor, pois há um jogo de palavras, um trocadilho, que gera 2 ou 3 interpretações diferentes. A mais adequada, no Brasil, seria "Jogos de Estado"). Já tinha visto no cinema, ano passado, e resolvi rever agora. Fosse este um post exclusivo sobre esse filme e teria o título "em busca da verdade". O filme é uma grande e bela elegia ao jornalismo. Algo realmente bonito, que compararia inclusive ao clássico "Todos os homens do presidente", talvez a maior homenagem ao jornalismo já feita pelo cinema. Quando digo comparar, claro, resguardadas as devidas proporções. "Todos os homens..." é um classico absoluto do cinema, e "Intrigas..", apesar de ser excelente, não chega a inscrever seu nome no roll dos maiores. Digo comparar no tocante à fé manifestada no jornalismo. O filme é muito bom, enquanto trama policial de investigação; é sobre um jornalista que investiga um assassinato que pode envolver uma conspiração corporativa e um jovem deputado, seu amigo da faculdade (na verdade a trama vai muito, muito além, mas não vou estragar a surpresa aqui). E o filme é bonito, enquanto elegia ao jornalismo. Quando vi pela primeira vez, ano passado, gostei do filme mas odiei o final; tinha achado que o final tinha estragado tudo. Hoje vi diferente. Interessante como os olhos mudam, depois de passado algum tempo, que nem é tanto tempo assim, né? Na primeira vez que vi, não gostei do final pois desejava um final "real", pragmático, que retratasse a realidade. Hoje gostei do final por entender o filme não como um retrato da realidade, mas como essa elegia ao dever ser, do mundo ideal. O mundo e o jornalismo e os jornalistas não são como retratados no filme, mas deveriam ser. Se pegarmos pela ótica marxista, é um encobrimento da realidade, mas acho que podemos deixar Marx de lado de vez em quando. Eu acredito, ou quero ainda acreditar, no ideal de jornalismo que o filme passa. Deveria ser exibido nos cursos de jornalismo, ao lado de "Herói por acidente". Só devemos ter cuidado e consciência para saber que é um ideal, e não a realidade.
Bem, acho que por hoje, é só pessoal. Volto a qualquer momento, no novamente tradicional post da madugada, ou em boletim especial. ;)
segunda-feira, 12 de julho de 2010
Dica: Bobbio
Dica do dia: Bobbio e o labirinto da história.
Leitura fácil, rápida, direta e valorosa. Fica a dica.
"A história é um labirinto. Acreditamos saber que existe uma saída, mas não sabemos onde está. Não havendo ninguém do lado de fora que nos possa indicá-la,devemos procurá-la nós mesmos. O que o labirinto ensina não é onde está a saída, mas quais são os caminhos que não levam a lugar algum."
Norberto Bobbio
Continua aqui: http://posjor.ufsc.br/public/docs/243.pdf
Ingenuidade
O Cardeal Dom Odilio Scherer escreveu, no último sábado, um artigo, publicado no Estadão e disponível aqui, muito interessante do ponto de vista do resgate histórico que faz a respeito de Tomás Morus, santo protetor dos governantes e políticos e tomado pelo autor como exemplo de ética. Concordo com o ponto de vista de Scherer sobre a importância e necessidade emergente de sermos mais éticos, não cedermos em nossos valores. Contudo, o que me chama atenção e desejo comentar são os primeiros parágrafos, dos quais discordo e apontarei o porquê. Cito:
A campanha em favor da ficha limpa mobilizou, em todo o Brasil, milhões de pessoas que acreditaram na possibilidade da decência e da ética na política. Em Brasília houve quem apostasse que seria mais fácil a vaca voar do que esse projeto de lei de iniciativa popular passar pelo Congresso Nacional.
Surpresa! A vaca não voou, mas o projeto passou, a lei já foi sancionada e está em vigor. Agora é vigiar e clamar pela sua aplicação correta. O País agradece a tantos cidadãos que se empenharam para barrar, antes das urnas, pretendentes a mandatos políticos que não podem ostentar idoneidade moral para governar ou legislar.
Será bom para o Brasil. Muito bom.
Eu acredito sim, em certa medida, na força do povo. Ela se manifestou, bem evidente, por exemplo, em 2006, quando este se opôs à opinião da mídia re-elegendo Lula. Mas não dessa vez. O que houve não foi povo, nesse caso não existe a força do povo. Simplesmente não existe. Acreditar que o projeto ficha limpa foi aprovado por causa do povo, sua força, sua mobilização, ou o que quer que seja é ser muito ingênuo, ao extremo, ou estar ao lado de uma corrente ideológica que deseja vender esta idéia, mesmo não sendo verdadeira. É uma tolice acreditar que esta lei foi aprovada pela pressão que os cidadãos exerceram. Fosse assim, e diversas outras leis também teriam sido aprovadas. O fato de ser uma lei de iniciativa popular nada quer dizer; há dezenas de outras que vão para as gavetas. O que ocorreu foi uma conjugação de interesses. Interesses políticos e interesses da mídia. Esta sim, ao adotar o projeto por seus próprios interesses (que nada tem a ver com o povo ou com sua preocupação por este), exerceu pressão e influencia. Devemos ser menos ingênuos.
domingo, 11 de julho de 2010
Bruno, o goleiro
Muito se tem explorado na mídia esses dias o caso do goleiro Bruno, do Flamengo, que supostamente (mas provavelmente) teria matado a ex-amante. Apesar do caso já estar se tornando batido, há dois aspectos que quero discutir, deixando um pouco a noção de moral de lado. Haverão aqueles que me interpretarão mal o que direi, e me julgarão, mas enfim...
O primeiro ponto é sobre a criatividade do caso. Ok, foi uma tragédia, o que ele fez foi errado, bla-bla-bla. Agora que superamos isso, vamos ao que interessa. Poxa, esquartejar e dar o corpo para 11 cães rottweilers comerem foi algo muito inteligente. Se não há corpo, não há provas, não há caso. Cadê o corpo? Provem onde está o corpo! Entenderam meu ponto de vista? Tá, ele é um monstro, tem sangue-frio, bla-bla-bla todo de novo. Disse que iria deixar a moral de lado. Foi inteligente dar a garota para ser comida pelos cães. Me lembrou um episódio dessa temporada da série Medium, em que o criminoso dá o corpo de uma moça, que havia sido assassinada, para os porcos comerem, assim livrando-se da acusação. Na verdade, é parecido até demais. No episódio, a linha de defesa é dizer que ela está desaparecida e não há provas que esteja morta, exatamente o mesmo que a defesa do goleiro fez, no princípio. Como o episódio é recente (alguns meses apenas), cabe perguntar: será que ele assistiu a série e se inspirou? Bom, ele não foi tão inteligente assim, pois foi mal feito, não foi eficiente ou eficaz. Principalmente ao livrar-se dos ossos. Concretou-os. Tipo coisa da máfia. Isso dava certo no passado, mas não mais. A grande desvantagem de concretar os ossos é que eles ficam ali, paradinhos, esperando alguém os descobrir. Tolice. Melhor teria sido outro lugar, em que, numa situação de contigenciamento, pudessem ser removidos para que a polícia não achasse. Tudo bem, não foi uma péssima idéia, mas também não foi das mais brilhantes, como o aspecto do corpo e dos cães. O que fodeu com tudo foi a fragilidade emocional desses merdinhas de comparsas, que já vão confessando tudo, por medinho. São uns retardados, pois se incriminaram pela promessa de vantagens posteriores no tribunal. Se não tivessem confessado (inclusive onde os ossos estavam concretados, numa casa) simplesmente teriam escapado, sem punição, sem provas.
O segundo ponto que quero discutir é a velha questão, que já tratei superficialmente aqui, que não sou eu quem levanta, mas a filosofia, de o quanto o belo compensa o feio, ou a arte compensa a monstruosidade, ou, inversalmente, a "monstruosidade" contamina o "belo". Nesse último sentido um ótimo exemplo, e já escrevi sobre isso, é sobre como algumas idéias de Goebbels e Hitler, muito boas e proveitosas para os campos da ciência política e sobretudo da comunicação, são simplesmente abominadas pois foram proferidas por Goebbels e Hitler. No outro sentido, há dois belos exemplos que me lembro agora. Elia Kazam, grande cineasta, mas que na guerra fria colaborou com o macarthismo, entregando companheiros e amigos, tornando-se um traidor. Apesar disso, recebeu um Oscar honorário, em 2004, em reconhecimento de sua arte, apesar de sua pessoa. Muitos entendem que a arte compensa desvios de caráter. A biografia de grandes compositores está marcada por graves falhas de caráter, mas nos esquecemos disso, em virtude de suas obras. Wagner era um veemente anti-semita, o que gera até hoje especulações sobre sua estreita relação com o nazismo. O mesmo vale para Richard Strauss. Outro célebre anti-semita foi John Nash, matemático brilhante criador da teoria dos jogos e do dilema do prisioneiro. Ele ganhou uma cine-biografia, estrelada por Russell Crowe (o filme, mediano, chama-se "Uma Mente Brilhante" e ganhou o Oscar de melhor filme, injustamente), cujos aspectos negativos foram todos simplesmente limados, ignorados ou apagados. Não pega bem, né? As pessoas não aceitam que as pessoas são boas e más ao mesmo tempo; exigem uma tomada de posição unilateral, e nisso há essa contaminação entre aspectos positivos e negativos, em que um prevalece sobre o outro. Mas onde quero chegar? O belo às vezes, tão belo, faz desaparecer o feio. Não sabia e soube recentemente que Bruno não era apenas um jogador, mas um excelente jogador. Pelo que soube, tem um recorde impressionante de defesa de penaltis, e estava sendo sondado para ser comprado pelo Milan. Ora, o Brasil precisará em breve de renovação de goleiro na seleção. Bruno é um excelente goleiro. É fato, goste-se ou não, que, para o Brasil, o futebol é como a música instrumental para a Alemanha. Essa é nossa arte. Não estou dizendo que seja a única, mas é algo valorizado por nosso povo. Sendo Bruno um artista de nosso povo, por que não deixar que sua arte supere seu lado monstruoso? Não estou defendendo isso ou aquilo, apenas levantando uma hipótese perfeitamente plausível, baseado em casos históricos. Como dizem, a arte compensa tudo. Será?
Apenas alguns pontos de reflexão sobre o caso, e por fim, deixo acima uma charge que achei realmente muito boa. Os ícones representacionais dos assassinos. A máscara de Jason, assassino dos filmes "Sexta-Feira 13", a focinheira de Hannibal Lecter, o canibal de "O Silencio dos Inocentes", e as luvas do goleiro Bruno, manchadas de sangue. Rsrss. Muito engraçado. Isso, já pra finalizar, me traz a mente outras duas questões. A primeira é que a luva, representando o goleiro, indica que este já está entrando para os ícones dos assassinos, já está virando um signo. Interessante, não? Ele já foi julgado culpado, e não há mais volta. A segunda coisa que me vem à mente, lembrada pela presença na charge de Hannibal Lecter, é a possibilidade de ele ter dado outros usos para partes do corpo da moça. Tendo a oportunidade, já que estava esquartejando mesmo, será que nem lhe passou pela mente (ou mesmo o fez) provar um pedaço, tal como Hannibal, o canibal? Afinal, ele já era mesmo um criminoso e pecador (se acreditar nisso), experimentar de nada acarretaria algo a mais... Não cru, obviamente. Mas depois de tanta literatura a respeito, na situação dele, eu experimentaria um pouco de carne humana bem preparada. Com vinho Chianti, como nos ensinou Hannibal.
P.S. Leiam todo este post como um relativismo de mim mesmo. Não são necessariamente minhas opiniões pessoais, mas provocações. Provocações filosóficas, sobre o ser e a sociedade. Se não entenderem isso, bem, vocês não entenderam nada...
sábado, 10 de julho de 2010
Parabéns Uruguai
Acabou a pouco o jogo de disputa do 3º lugar da Copa do Mundo de futebol, que para mim atraiu mais atenção que a própria final de amanhã. Uruguai enfrentou a Alemanha. Infelizmente não deu para nossos irmãos. A Alemanha venceu por 3 a 2, mas o jogo foi guerreado, bonito. Nossos irmãos fizeram bonito nessa copa. Perderam com dignidade, bonito. Uma coisa que achei estranha, errada, foi que a platéia vaiava cada vez que o jogador uruguaio (não lembro seu nome) que tirou a bola com a mão contra Gana pegava a bola. Estão considerando como atitude anti-esportiva, ou sei lá o que. São uns tolos, os que assim pensam. Tá, ele interferiu no resultado do jogo, mas e daí? Foi a atitude absolutamente correta, a mais corretíssima a ser tomada. Covarde teria sido em não fazê-lo, e refugiar-se na pseudo-esportividade. Foda-se a esportividade. O que querem é ganhar. O caso é lindo, e merece ser narrado. Uruguai e Gana estavam empatados em 1 a 1 nas quartas de final. Já era segundo tempo da prorrogação. Já passado mais de 15 minutos do segundo tempo da prorrogação (ou seja, no momento de acabar o jogo), Gana vai pro ataque. O Goleiro uruguaio cai. Gana chuta e um jogador uruguaio, posicionado na marca do gol, defende com a perna/corpo. A bola rebate e volta para o jogador de Gana, que chuta novamente, mais alto. Em cima da linha do gol, o jogador do Uruguai defende a bola com a mão, como se fosse o goleiro, impedindo o gol certo. Ele é expulso e é marcado penalti para Gana. Bastava marcar, e o jogo acabava, mas o jogador de Gana chuta para fora, e o jogo vai para os pênaltis. Nos pênaltis, o goleiro do Uruguai defende dois, e o Uruguai vence o jogo e passa para as semi-finais. Lindo. O cara simplesmente foi o herói nacional. Ele salvou sua pátria. Se sacrificou, foi expulso, mas salvou sua nação, que está acima dele. É esse tipo de atitude, esse tipo de doação, que acho bonita. E por isso achava bonita a seleção de Dunga. Apesar de terem perdido para a Holanda nas quartas de final, eles também tinham essa doação, para a seleção acima de si próprios, o que não existia na seleção de astros egoístas e egocêntricos passada, de Parreira, em 2006. Por isso, apesar da nossa derrota, também considero uma vitória, e não uma fracasso como em 2006. Tá, nessa defesa do Uruguai muito provavelmente tem muito de argumentum ad hominen. Ou seja, digo isso pois se trata de um time que eu gosto. Se fosse com a Argentina ou Alemanha, cuja arrogância de ambos não gosto, meu argumento seria o oposto. Mas e daí? Todos escolhemos posições e somos parciais. Ao menos tenho consciencia disso. Achei, sim, muito bonito e correto o que o jogador do Uruguai fez. Merecia ir mais longe na Copa, mas já valeu. Parabéns Uruguai.
O fim de uma tradição
Desde 1995 eu compro a Revista Set. É uma revista de cinema. Muito provavelmente a mais importante do país. Ou pelo menos era, até agora. Quando mais novo, ficava apreensivo, esperando chegar a edição do mês, para ler e devorar a revista. Já faz uns tempos, com o advento (parênteses: acho muito interessante essa palavra, "advento". Já perceberam como ela está carregada de valorações? Um "advento" é necessariamente algo que traz beneficios... fim do parênteses) da internet, não a leio mais. Por isso, e por sua linha editorial, priorizando blockbusters e afins. Passei a não gostar. Já fazia uns dois anos que não lia, mas continuava comprando. Comprando e guardando. Principalmente, senão unicamente, por tradição. Tenho todas as edições desde 1995. São 15 anos. Tradições assim não se rompem facilmente. Continuando. Fazia já algum tempo que comprava mas não lia, guardava. Ano passado, devido à uma crise financeira e de vendas, que incluiu a falencia da editora e a venda da marca para outra editora, toda a editoria, que já se estabelecera há quase uma década, foi trocada. Todo o processo gerou muitas brigas internas. Muitos leitores não gostaram. Eu vi a mudança como positiva. Por três edições, a revista passou a ser comandada por um novo editor. Durante três edições voltei a ler, pois a revista voltou a ser sobre cinema, verdadeiramente. Infelizmente, ela retornou para as mãos do velho editor, cujo ego se confunde com a revista, como Luis XIV e o seu "o Estado sou eu". O editor temporário, e outros, em cisão, fundaram duas novas revistas, o que foi muito positivo para o público. Em toda essa briga, várias edições da Set foram saltadas, ou seja, em muitos meses não foi publicada a revista. O atraso das edições permaneceu esse ano, e até onde sei, ainda permanece. O fato é que, atrasadas as edições, perdi o costume costumaz de comprar a revista. Mês passado, por esquecimento, foi a primeira edição que deixei de comprar em 15 anos. Percebi que não me importo mais com a revista, que a tradição perdeu seu sentido para mim, ainda que tenha significado muito no passado. Resolvi acabar com essa tradição. Ainda comprarei a Set, muito eventualmente, quando algo me interessar, mas percebi que, assim por um esquecimento, quase organicamente, a tradição havia se acabado. Acho que o primeiro passo para uma tradição morrer, provavelmente, seja ela tornar-se apenas isso, uma tradição desprovida de sentido ou função. A compra da Set havia continuado como tradição, para mim, mas sem função de leitura. Bastou o tempo que essa tradição fosse abandonada.
sexta-feira, 9 de julho de 2010
Isso sim é tecnologia! (Ou: O Fogo)
A mesa do meu computador, assim como meu quarto em geral, é extremamente mal-organizada. Isso é um eufemismo. Caos talvez seja a palavra que mais se aproxime da realidade. Em se colocando algo n'algum lugar, lá permanece. Há cerca de três meses, há um isqueiro quase na borda da mesa, esquecido por uma amiga que aqui esteve. Hoje peguei-o e fiquei olhando para ele, admirando-o. Ele não tem nada de especial, mas tem tudo de especial. Um girar de dedo, uma faisca, gás, e eis a chama brilhante, fogo portátil. É um isqueiro simples, desses básicos, comuns, vermelho, da marca bic. Fiquei admirando e pensando como a humanidade pode chegar a avanços tecnológicos tão fabulosos. Algumas pessoas se deslumbram com a tecnologia de ponta, com foguetes ou computadores. Eu não. Eu me deslumbro com tecnologias como essa. Por centenas de anos, milênios, o homem lutou pelo fogo. Conseguiu sua sobrevivência enquanto raça, e o inicio de nossa civilização, a partir do momento que dominou a arte de criar o fogo. É incrível pensar que algo que no passado foi fundamental para nos distinguir dos outros animais, algo que gerou guerras entre os povos primitivos, agora está a nossa disposição, já tão internalizado que nem damos atenção (parênteses: taí um bom tema de estudo: a internalização das tecnologias), que nem notamos sua maravilha. Está a nosso alcance, a um girar de dedos. Isso sim é tecnologia!
domingo, 4 de julho de 2010
Férias, tempo e idéias em rascunhos
O semestre de aulas acabou e as férias começaram. Durante este período, por mais que me esforce para escrever, não tenho muito tempo. Tenho idéias do que desejo escrever, mas não tempo para sentar e formular. Geralmente escrevo apenas o tema, a idéia central, e salvo como rascunho, para não perder a idéia do mote, o tema, já que minha memória é realmente ruim. Tenho alguns temas salvos, em rascunho. Nos próximos dias, os escreverei. Alguns, inevitavelmente, parecerão anacrônicos, fora de seu tempo, uma vez que foram inspirados por um fato específico e temporal, que já está passado. Mesmo assim, os escrevei. Vale a pena. Portanto, aguardem. Nova produção, em breve.
quinta-feira, 1 de julho de 2010
O equilíbrio e Jung
Quem me conhece e me lê aqui sabe que gosto do conceito de equilíbrio, embora muitas vezes não consiga pô-lo em prática. Significa dizer que acho que deve existir um equilíbrio entre as diversas esferas que compõem nossa vida, a intelectualidade, o lúdico, os devaneios, o amor... nada que penda para apenas um lado apenas estaria em harmonia, e não poderia levar à algo parecido com satisfação ou plenitude. Já defendo isso faz tempo, mas só nos últimos meses tive contato com Jung. Gostei muito, pois ele defende e escreve nesse mesmo sentido. Para Jung, deve existir um equilíbrio entre o consciente e o inconsciente coletivo, ou seja, entre o racionalismo e a esfera de nossa espiritualidade, o inexplicável. A partir disso Jung faz uma crítica à cultura moderna. No século XX passamos a dar atenção demais ao lado racional, relegando o inconsciente, e este desequilíbrio é um mal, e um mal perigoso. Ele analisa, por exemplo, a ascensão do nazismo não pelo viés político-econômico (que gosto muito, ressalte-se) mas a partir do “recalcamento” (aspas pois esse é um termo freudiano, não dele) do mal. A sociedade do final do século XIX e inicio do XX se queria puritana, boa. Por isso, escondeu-se a existência do mal. Tudo aquilo que é escondido, um dia vem à tona, com mais força, e foi isso que aconteceu com o nazismo; era a concentração da existência do mal negado pela sociedade de então. Se formos analisar a sociedade de hoje (e aqui quem fala é o Márcio, não mais Jung), de fato, as pessoas não têm esse equilíbrio entre o racional e o espiritual. As pessoas religiosas, por exemplo, tendem a negar em boa medida o racionalismo. É algo complicado, que acredito, como Jung, pode gerar muitos males. Para o individuo e para a sociedade. Por isso, apenas reforço minha crença no equilíbrio.
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