segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Uma esquina

Sarah e Marcelo caminhavam tranquliamente em uma manhã de domingo por uma região do centro de Curitiba. Domingo pela manhã, naquele pedaço da cidade, as ruas estão desertas. Surge vindo a eles um homem. Jovem, por volta de seus 30 anos, bem vestido, parecia que acabara de tomar banho, e caminhando estavelmente. Não estava bebado, nem parecia um medingo, apesar das marcantes bolsas sob os olhos. Também não dava a impressão de ser perigoso, um criminoso. Chegou a eles numa esquina:
- Posso falar com vocês?
Os dois estavam sem pressa naquela manhã. Pararam. Pararam naquela esquina.
- Eu sou alcoolatra. - disse o homem.
Toda a conversa não demoraria mais que alguns minutos, mas marcaria.
Valdir é meu nome, disse, e pôs a contar sobre si. Como viera de longe, e estava sem rumo nessa cidade.
- Por causa da bebida perdi tudo, destrui meu casamento, minha mulher me abandonou.
Hoje ele conseguiu se livrar de um vicio, substituindo-o por outro. "Começei a usar crack para parar de beber". Era isso que ele estava indo fazer naquela manhã, nutrir seu vicio. Apontou para a outra esquina. Um homem, de boné, parado, o esperava para vender seu produto.
- Eu quero parar, e sei que só eu posso me ajudar, mas não consigo. Vou atravessar a rua, e vou continuar.
- Você ter essa noção, ter auto-conciencia de sua situação, é um passo importante já. - disse Sarah.
- Não adianta eu ter essa noção, e não conseguir dar o próximo passo.
O silêncio reinou por um breve momento, que, mesmo breve, pareceu longos minutos.
- Eu estou aqui hoje, falando com vocês, pois preciso saber se alguém ainda se importa comigo, se alguém ainda está escutando.
Sarah só pôde dar um reconfortante sorriso a ele, como quem diz sim, estou escutando.
- Quando eu estiver mal, posso pensar em vocês? Pensar, acreditar, que alguem nesse mundo ainda se importa comigo? - perguntou aquele homem, com os olhos marejados.
Sarah abraçou-o.
Ele ajeitou a camisa e disse que tinha que ir. Após uma profunda troca de olhares com Sarah virou-se e pôs-se a andar. Sarah e Marcelo ficaram por um instante parados, observando. Eles seguiram seu caminho, para nunca mais cruzarem novamente com aquele homem, enquanto Valdir seguia até a outra esquina, o destino que o aguardava.
Sarah sempre pensa em Valdir.

***

História contada por minha amiga Sarah. Triste, muito triste. Quase chorei. Mas bela, pelos simbolismos que carrega.

sábado, 28 de novembro de 2009

Bom jornalismo

Fiquei com muita, muita vontade de enviar isso a todos meus amigos. Como me propus a conceber um blog para, entre outras coisas, parar de encher a caixa de e-mail deles com coisas do genêro, vou tentar resistir, até onde eu puder.
Do site Vi o Mundo, do jornalista Luiz Carlos Azenha, reprodução de artigo do Der Spiegel sobre o Brasil.
É esse tipo de jornalismo que eu gostaria de fazer, que eu considero o verdadeiro jornalismo, alicerçado sob a tradição norte-americana (tenho que reconhecer que ao menos nisso os gringos são bons) que une jornalismo à literatura. Ou seja, liberdade para textos longos, composições complexas de texto, e técnicas narrativas vindas da literatura. Amo isso.
Mas como já disse, é muito mais literatura, do que aquilo que hoje em dia chamam de jornalismo. Sei que odiaria o curso de jornalismo pelo tecnicismo, pela pseudo-imparcialidade, e pelo próprio mercado de trabalho, no qual não existe espaço para excelentes artigos como esse. Mas isso, a concepção de artigos de qualidade, vai muito além do jornalismo, depende da sua sensibilidade, seu talento, e sua escrita. Nada me impede de escrever. Isso eu faço, e continuarei fazendo, espero. Inspirado por coisas assim. Meus olhos estavam marejados ao findar do texto.
Ah, é curioso notar que enquanto a Veja e congeneres "metem o pau" no Lula, internacionalmente ele é elogiado a este ponto. Lembrando que o Der Spielgel é uma das mais importantes publicações da Alemanha e do mundo.

***

"Pai dos Pobres" provocou milagre econômico no Brasil
Jens Glüsing - Der Spiegel
Tradução: George El Khouri Andolfato

O Brasil é visto como uma história de sucesso econômico e sua população reverencia o presidente Luiz Inácio Lula da Silva como um astro. Ele está na missão de transformar o país em uma das cinco maiores economias do mundo por meio de reformas, projetos gigantes de infraestrutura e explorando vastas reservas de petróleo. Mas ele enfrenta obstáculos.
Elizete Piauí aguarda pacientemente por horas à sombra de uma mangueira. Ela calça sandálias de plástico e veste um short largo sobre suas pernas finas. A 40ºC, o ar tremula neste dia incomumente quente na Barra, uma pequena cidade no sertão, o coração do Nordeste brasileiro. Mas Elizete não se queixa, porque hoje é seu grande dia, o dia em que se encontrará com o presidente, que está trabalhando para fornecer água encanada para sua casa.
O barulho de um helicóptero sinaliza sua chegada. A aeronave branca sobrevoa a multidão antes de pousar. Uma escolta de batedores acompanha o presidente até a cerimônia.
Lula sai da limusine vestindo uma camisa branca de linho e um chapéu militar verde. Ignorando os dignitários locais em seus ternos pretos, Lula segue direto para a multidão atrás de uma barreira de segurança. "Lula, Papai!", chama Elizete. Ele a puxa até seu peito e aperta a mão de outros na multidão, permitindo que as pessoas o toquem, façam carinho e o abracem. Gotas de suor correm pelo seu rosto corado enquanto pessoas o puxam pela camisa, mas Lula se deixa embeber na atenção. Ele se sente em casa aqui, em uma das regiões mais pobres do Brasil.
O presidente passa três dias viajando pelo sertão. Ele conhece a rota. Ele veio à região pela primeira vez há 15 anos, em campanha, viajando de ônibus e ficando hospedado em locais baratos. Ele fazia paradas em todas as praças, sete ou oito vezes por dia, geralmente realizando seus discursos na traseira de um caminhão. Sua voz geralmente ficava rouca e fraca à noite e ele tinha que trocar sua camisa suada até 10 vezes por dia.

'Ele ainda é um de nós'
Agora ele viaja de helicóptero e carros blindados, com os carros da polícia, com suas luzes piscando, abrindo o caminho ao longo das estradas. Voluntários montam aparelhos de ar condicionado e bufês nos aposentos de Lula, às vezes até mesmo estendem um tapete vermelho. A imprensa critica as despesas, mas isso não incomoda a maioria dos brasileiros, porque eles têm orgulho de seu presidente. Ele chegou ao topo, eles argumentam, então por que não desfrutar de seu sucesso? "Ele ainda é um de nós", diz Elizete, "porque ele é o pai dos pobres".
Lula está familiarizado com o destino dos nordestinos pobres do Brasil. Ele nasceu no sertão, mas sua mãe colocou seus filhos na traseira de um caminhão e os levou para São Paulo, 2 mil quilômetros ao sul. A posterior ascensão de Lula ao poder começou nos subúrbios industriais de São Paulo. Sua mãe foi uma das centenas de milhares de pessoas carentes que deixaram o sertão atormentado pela seca, com seus campos ressecados e animais morrendo de sede, e migraram para o sul mais rico, para trabalhar como porteiros, garçons, operários de construção ou empregados domésticos.
Em um plano para tornar verde esta região árida, Lula está explorando as águas dos 2.700 quilômetros do Rio São Francisco, um rio vital para grandes partes do Brasil. O rio fornece água para cinco Estados, mas ele faz contorna o Sertão. Segundo o plano de Lula, dois canais desviarão água do rio por 600 quilômetros até as áreas atingidas pela seca. "É o mínimo que posso fazer por vocês", Lula diz às pessoas na Barra.

Projeto controverso
O megaprojeto, que exige a superação de uma diferença de altitude de 200 metros, tem um custo estimado de R$ 6,6 bilhões. Lula posicionou soldados na região para escavar os canais. Oito mil trabalhadores labutam nos canteiros de obras enquanto tratores e escavadeiras movem a terra pela estepe. Se tudo correr bem, 12 milhões de brasileiros se beneficiarão com o projeto de transposição de águas, que deverá ser concluído em 2025. É o maior e mais caro projeto de Lula, assim como provavelmente seu mais controverso.
Aqueles que o apoiam comparam Lula ao presidente americano Franklin D. Roosevelt, que represou o Rio Tennessee nos anos 30, para fornecer eletricidade à região, e que lançou o New Deal, um imenso programa de investimento para superar a Grande Depressão. Mas os críticos veem a obra como um imenso desperdício de dinheiro. O projeto também atraiu a ira dos ambientalistas e até mesmo o bispo da Barra já fez duas greves de fome contra ele. Ele teme que o projeto de transposição das águas secará ainda mais o rio, alegando que a irrigação beneficiaria principalmente o setor agrícola.
O bispo não está presente. Dizem que ele está participando de reuniões fora da cidade. Na verdade, o religioso está mantendo discrição. As críticas ao presidente são desaprovadas por sua congregação. Lula fala a linguagem das pessoas comuns, contando histórias de sua juventude aos seus simpatizantes, histórias dos tempos em que sua mãe o enviava para buscar água e ele voltava para casa equilibrando um balde pesado sobre sua cabeça. Ele tinha cinco anos na época.
O Brasil já foi chamado de "Belíndia", um termo cunhado por um empresário que via o vasto país como uma mistura entre a Bélgica e a Índia, um lugar com riqueza europeia e pobreza asiática, onde o abismo entre ricos e pobres parecia intransponível. Lula foi o primeiro a construir uma ponte entre os dois Brasis.
Agora ele é tanto o queridinho dos banqueiros quanto ídolo dos pobres. Com o chamado presidente operário no comando, o Brasil está atraindo investidores de todas as partes do mundo. Jim O'Neill, o economista chefe do Goldman Sachs, inventou a sigla Bric para as economias emergentes do Brasil, Rússia, Índia e China, prevendo um futuro brilhante para o gigante sul-americano. Mas seus colegas zombaram dele. A China e a Índia certamente tinham perspectivas, mas o Brasil? Por décadas o país era visto como um gigante acorrentado, atormentado por crises infindáveis e inflação.

Potência econômica ascendente
Mas hoje o "B" é a estrela entre os países Bric, com os especialistas prevendo um crescimento de até 5% para a economia brasileira em 2010. O Brasil está atualmente crescendo mais rápido do que a Rússia e, diferente da Índia, não sofre de conflitos étnicos ou disputas de fronteira. O país de 192 milhões de habitantes possui um mercado doméstico estável, com as exportações - carros e aeronaves, soja e minério de ferro, petróleo e celulose, açúcar, café e carne bovina - correspondendo a apenas 13% do produto interno bruto.
E como a China substituiu os Estados Unidos como maior parceira comercial do Brasil no início deste ano, o país não foi severamente afetado pela recessão no mercado americano como poderia ter sido. Os bancos do Brasil são fortes, estáveis e não encontraram grandes dificuldades durante a crise. Mais importante, entretanto, é o fato do Brasil ser uma democracia estável, ao estilo ocidental.
O país pagou sua dívida externa e até mesmo passou a emprestar ao Fundo Monetário Internacional (FMI). O governo acumulou mais de US$ 200 bilhões em reservas e o real é considerado uma das moedas mais fortes do mundo. Especialistas internacionais preveem uma década de prosperidade e crescimento para o país. Lula prevê que o Brasil será uma das cinco maiores economias do planeta em 2016, o ano em que o Rio de Janeiro será sede dos Jogos Olímpicos. O país será sede da Copa do Mundo de 2014.
E ainda há os recursos naturais aparentemente ilimitados do Brasil, vastas reservas de água doce e petróleo. O Brasil exporta mais carne do que os Estados Unidos. E a China estaria em dificuldades sem a soja brasileira. Nos hangares da fabricante de aviões, a Embraer, perto de São Paulo, engenheiros brasileiros constroem aviões para companhias aéreas de todo o mundo, incluindo aviões para trajetos menores para a Lufthansa.

Um patriarca extremamente popular
Em outras palavras, o presidente Lula tem bons motivos para estar repleto de autoconfiança. O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, e o presidente da França, Nicolas Sarkozy, o estão cortejando, enquanto Wall Street praticamente o venera. Ele é até mesmo tema de um novo filme, "Lula, o Filho do Brasil", que descreve a saga de sua ascensão de engraxate a presidente.
Todo o Brasil desfruta da fama de seu presidente que, há menos de sete anos no poder, atualmente conta com um índice de aprovação acima de 80%. A oposição praticamente desapareceu e o Congresso se tornou submisso. Lula dirige o país como um patriarca, tanto que seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso, o está acusando de "autoritarismo" e alertando que o Brasil está no caminho de um capitalismo estatal.
Há um quê de verdade nas alegações de Fernando Henrique. Lula nunca teve confiança na capacidade do mercado de curar a si mesmo e considera que o Estado deve moldar uma nova ordem social. Ele adora projetos impressionantes e gestos nacionalistas. Ele é pragmático, mas despreza especuladores. "Brancos com olhos azuis" levaram o mundo à beira da ruína financeira, ele disse recentemente. Ele falava dos banqueiros.
A crise financeira apenas confirmou o ceticismo de Lula em relação ao capitalismo. Lula acredita que o Brasil lidou melhor com a crise do que outros países porque o governo adotou medidas corretivas desde cedo. Segundo Lula, o combate à pobreza e a distribuição justa de renda não podem ficar aos cuidados do mercado.

Classe média crescente
Sob sua liderança, milhões de brasileiros ingressaram na classe média. A evidência dessa transformação social está por toda a parte: nos shopping centers do Rio e São Paulo, lotados de famílias barulhentas da periferia, ou nos aeroportos, onde mães jovens ficam na fila do balcão de check-in, aguardando para embarcar em um avião pela primeira vez em suas vidas. "A desigualdade entre ricos e pobres está começando a diminuir", diz o economista e especialista em estudos sobre a pobreza, Ricardo Paes de Barros.
A chave para aquela que provavelmente é a maior redistribuição de riqueza na história brasileira é o programa social Bolsa Família, sob o qual uma mãe carente que possa comprovar que seus filhos estão frequentando a escola recebe até R$ 200 por mês do governo. A primeira vista pode não parecer muito, mas este subsídio do governo ajuda milhões de pessoas a sobreviverem no Nordeste brasileiro.
Especialistas inicialmente criticaram o programa como sendo apenas uma esmola, mas agora ele é visto como um modelo mundial. Mais de 12 milhões de lares recebem os subsídios, com grande parte do dinheiro indo para o Nordeste. Graças ao programa Bolsa Família, a região antes atingida pela pobreza começou a prosperar. Muitos nordestinos abriram pequenas empresas ou lojas e a indústria descobriu o Nordeste como mercado. "Agora a região está crescendo por conta própria", diz Paes de Barros.
Lula foi abençoado pela sorte. Seu antecessor, Fernando Henrique, já tinha estabilizado a economia, que sofria com a hiperinflação, quando foi ministro da Fazenda em 1994. Ele impôs uma reforma da moeda ao país e implantou leis que forçaram o governo a adotar políticas com responsabilidade fiscal. Lula não mudou nada disso.
Não havia necessidade de Lula reinventar a política econômica e social do Brasil. O país tem uma tradição de controle total da economia pelo governo que remonta aos anos 30.

O plano Marshall próprio do Brasil
Os centros nervosos da política econômica do país ficam abrigados em dois imponentes arranha-céus no centro do Rio. O Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES), que conta com seus escritórios em uma torre de aço e vidro, foi criado com a ajuda americana e usando o KFW Banking Group da Alemanha como modelo. Ele financiou uma versão brasileira do Plano Marshall.
Nos anos 90, o BNDES administrou com sucesso a privatização de muitas estatais brasileiras. Hoje, ele fornece assistência a fusões e aquisições corporativas, ajuda empresas em dificuldades e financia os investimentos estratégicos do governo.
O BNDES é altamente respeitado. Acredita-se que seja em grande parte livre de corrupção e ele paga os mais altos salários do país. "Há um ano, os bancos estrangeiros batiam à minha porta perguntando se o Brasil estava preparado para a crise financeira", diz Ernani Teixeira, um dos diretores financeiros do banco. Teixeira conseguiu tranquilizá-los, notando que o BNDES tinha separado R$ 100 bilhões em reservas adicionais. No ano passado, o banco emitiu mais empréstimos e garantias de empréstimos do que o Banco Mundial - e até apresentou um lucro respeitável.
O segundo pilar do milagre econômico brasileiro fica diagonalmente no outro lado da rua: um bloco de concreto, iluminado à noite com as cores nacionais, verde e amarelo, é a sede do grupo de energia semiestatal Petrobras. A empresa planeja investir US$ 174 bilhões nos próximos quatro anos em plataformas de perfuração, navios e outros equipamentos para explorar as grandes reservas de petróleo além da costa do Brasil.
Há um ano e meio, a Petrobras descobriu novas reservas de petróleo sob o leito do oceano. Mas o petróleo será difícil de extrair, por estar situado abaixo de uma camada de sal em profundidades de pelo menos 6 mil metros. A expectativa é de que os poços comecem a produzir daqui pelo menos seis anos. A receita desse petróleo será depositada em um fundo que o governo usará principalmente para financiar novas escolas e universidades.
Lula apresentou recentemente uma legislação que regulamentaria a exploração das reservas de petróleo submarinas, fortalecendo assim o monopólio da Petrobras. Especialistas temem que Lula esteja criando um monstro corporativo poderoso e corruptível.

Obstáculos burocráticos
O imenso apagão que ocorreu simultaneamente em grandes partes do país, há duas semanas, teria sido um sinal de alerta de que o governo está indo além de sua capacidade? A modernização da infraestrutura decrépita do Brasil está avançando, mas lentamente. Bilhões de dólares em investimentos em portos, construção de estradas e no setor de energia existem apenas no papel, com a implantação atrapalhada por uma burocracia kafkaniana e um Judiciário moroso. Além disso, o país também não teve muito sucesso no combate à criminalidade.
Lula tem mais um ano no poder, após ter resistido à tentação de manipular a Constituição para garantir sua reeleição para um terceiro mandato. Ávido em preservar seu legado, ele tem buscado a indicação de sua ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, como sua sucessora, apesar da resistência dentro do próprio Partido dos Trabalhadores.
Rousseff, que foi integrante dos grupos guerrilheiros de esquerda após o golpe militar de 1964 e que posteriormente passou anos presa, tem uma reputação de tecnocrata competente, mas é vista como inacessível e autoritária. Ela está acompanhando o presidente em suas viagens pelo país, inaugurando novas estradas e usinas elétricas. Lula a apoia de modo tão determinado que até parece estar fazendo campanha para si mesmo.
Ela também está com ele em seu giro pelo Nordeste, apesar dos médicos terem removido um tumor de sua axila há poucos meses. Acredita-se que ela esteja curada e ela atualmente usa uma peruca após a quimioterapia. Seu rosto é pálido e seu sorriso parece congelado. O presidente a puxa para o seu lado quando ele caminha até o microfone, e ele menciona o nome dela repetidas vezes.
Elizete Piauí, ainda completamente embriagada pelo seu encontro com Lula, a viu pela televisão. Ela sabe que Dilma é a candidata de Lula e ela fará campanha pela ministra, apesar de que preferiria que Lula permanecesse no poder. "Eu votarei em qualquer pessoa que ele indicar", ela diz.
Lula também prometeu retornar. Antes do fim de sua presidência, ele planeja fazer outra viagem ao Nordeste para ver o quanto progrediram as obras no Rio São Francisco. Talvez, espera Elizete, ele terá atendido seu maior desejo até lá e ela poderá servir a ele um copo de água - de sua própria torneira, em sua própria casa.


Extraido de: http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/der-spiegel-sobre-o-brasil/
Link original: http://www.spiegel.de/international/world/0,1518,662917,00.html

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Das coleções, relíquias e bens sentimentais (Ou coleção de selos)

Queria fazer um texto bem light, a partir de um tema absolutamente banal. Pensei nas coisas cotidianas, banais, que não renderiam, de forma alguma, um texto. Então veio-me à mente: coleção de selos. E o que que tem uma coleção de selos? Nada de especial. Ou tudo de especial. Eu não tenho coleção de selos, apesar de ter alguns guardados, nem meia dúzia. Acho que isso não faz de mim um colecionador. Mas por que as pessoas guardam selos, ou por que guardam quaisquer coisas? Coleções, eis aí o tema amplo.
Coleções, eu tenho. Tenho algumas. Gosto de colecionar camisetas, por exemplo. Destas temáticas, que só se usa uma vez na vida, enquanto naquela situação. Feira de profissões da Universidade, por exemplo. Eles distribuem as camisetas gratuitamente, como forma de divulgação. Uso durante o evento, mas não saio por aí com ela. Guardo-a, de lembrança daquela situação. A mesma relação tenho com viagens; sempre compro uma camiseta temática do local visitado, pelos mesmo motivos. Mas quais as relações por detrás disso? Por que as pessoas guardam essas relíquias, sejam selos, sejam camisetas, ou o que for?
A relíquia representa um bem sentimental, uma materialidade de algo. As lembranças são subjetivas e necessitam da materialidade para serem reforçadas e se realizar. Mas será que necessitam mesmo? Vejo a fotografia ser tratada assim. O registro do momento. Mais tarde, fotografias se tornam estes bens sentimentais. Mas, apesar de termos essas relações com este objetos, com essas relíquias, a gravação mais importante acontece não em um meio material, mas em nós mesmos. O objeto em si não representa nada, seja um selo, uma camiseta ou uma fotografia, somos nós que damos valor a ele. Ou seja, está em nós o valor, o bem sentimental. Eu mesmo tenho e gosto dessas materialidades, camisetas, fotos, e outras coleções, mas será mesmo que precisamos delas, uma vez que o valor está em nós?
Como cantaria Leoni:

O que vai ficar na fotografia
São os laços invisíveis que havia
As cores, figuras, motivos
O sol passando sobre os amigos
Histórias, bebidas, sorrisos
E afeto em frente ao mar.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Sobre trabalho participacionista

No dia em que saí (ou fui demitido, como preferirem) do estágio na UTFPR encontrei a prof.ª Valéria no corredor. Ela soubera do fato. Conversamos um pouco. Comentei que achava que uma instituição de ensino deveria ser flexivel de aceitar a falta de seus funcionários, quando para fins acadêmicos (faltava no estágio, por que sou representante discente na Câmara do Gestão Pública. A Câmara do Curso é, na Federal, o equivalente ao Colegiado da UTFPR, só muda o nome). A Valéria me respondeu que eu deveria me acostumar, pois dificilmente algum emprego iria ser tão compreensivo. Ela errou. Bom, ela acertou, ao falar sobre o resto do mundo, mas ela errou. Achei sim, um outro emprego, que é assim, que é muito mais.
Ganhei uma bolsa da UFPR. Provavelmente o Prof. Rodrigo pode ser considerado o melhor chefe do mundo. Aqui eu vou ter que fazer um parentesis, para falar sobre uma teoria, mas que tem a ver com o contexto. Nas Teorias da Democracia existe a teoria democratica participacionista, ou simplesmente corrente participacionista. Uns dos autores mais relevantes são Carole Pateman e Charles MacPherson. O mote maior de toda teoria participacinista é "o individuo deve participar de toda decisão que lhe afete". Essa teoria defende, entre outras coisas, a "democratização do ambiente de trabalho". A tese é: se um sujeito passa a vida inteira sendo mandado, obedecendo ordens, ele não "sabe" participar. Votar, uma vez a cada 4 anos, não significa nada para ele. Então, as pessoas tem que ser "empoderadas", devem passar a ter, no seu dia-a-dia, exercicios de participação, tomadas reais de decisão, como uma função "pedagógica" do ato de participar. Ou seja, o ambiente de trabalho não pode ser construido de cima para baixo, os empregados devem ter decisão sobre o próprio trabalho, sobre seus afazeres.
Agora sou bolsista da coordenação do curso de Gestão Pública. O prof. Rodrigo é o coordenador do curso. Perguntei, no primeiro dia: "O que eu faço agora? O que eu devo fazer, qual meu serviço?". "Faça o que você quiser, cara.", respondeu, tranquilamente. Ele, aparentemente, é adepto dessa teoria. Para ilustrar contou a história do filme "Mash". Robert Altman começou a filmar sem roteiro, os atores perguntavam pra ele o que fazer, e ele respondia "inventa". No fim, saiu um dos melhores filmes de guerra já feitos. Como eu disse, provavelmente poderia ser considerado o melhor chefe do mundo. O mais engraçado é que fui de um extremo a outro. Da Terezinha, autoritária-mór, ao Rodrigo, sem amarras ou compromissos.
E o que eu fiz? Devo reconhecer que muito pouco, por enquanto. Talvez a teoria esteja mesmo certa, e eu não saiba (ainda) participar, tomar as decisões que me afetam. É fato que funciono bem sobre pressão, as melhores coisas que faço, que produzo, são na véspera da entrega. Quase todas deixo para realizar na véspera da entrega. Sinceramente, me sinto um tanto estranho recebendo salário por isso. Não fiz nada até agora, praticamente, e lá se vai um mês. Não acho justo, mas também não vou dizer que quero deixar de receber. Ficar solto, sem pressão ou compromisso, para decidir eu mesmo o que quero fazer, foi (e está sendo) uma experiencia nova, estranha, mas, no fim, espero que produtiva.

domingo, 22 de novembro de 2009

Espoliações

Hoje o dia não foi bom, por diversos motivos. No texto anterior, creio que não dei a devida dimensão para a experiencia que sofri ontem, de quase ser assaltado. Já havia sido roubado antes, há uns anos (levaram minha camera, no carnaval) mas havia sido soft, "na manha", apenas com as mãos e o jeitinho. Nunca estive perante uma arma física. Ontem vi um canivete sendo empunhado perante mim. Graças a uma conjuntura de fatores (ou a Deus) o assalto não se concretizou - nem fui espoliado, nem ferido. Mas a sensação permanece.
Me sinto como aquelas pessoas (por vezes criticadas por mim) da classe média, que vão para a televisão fazer discurso com medinho da violencia. Há muito exagero nesses discursos burgueses, é verdade, mas a sensação de estar diante de uma arma, é dificil de descrever. É um choque, sem dúvidas. O sentimento, o medo, que alguém sente diante de seu semelhante não é algo que deveria fazer parte das relações humanas. E o que leva o outro a fazer isso? Qual a sensação, o sentimento, que o outro tem, no outro lado de uma arma empunhada? Por que coagir e espoliar?
Nas últimas férias, em junho/julho, fui roubado também, porém não estava presente. Na natação, que eu estava frequentando nas férias. O clube aqui de Matinhos é pequeno, e não tem muitos alunos simultaneamente, dois ou três, sendo que muitas vezes ficava sozinho. Também não tem ármarios com chave, ou coisa do tipo. Deixava minha mochila num canto, no vestiário. Dentro, a carteira. Certo dia, sumiu (e eu só perceberia no dia seguinte) 50 reais de dentro da carteira. Posso ser criticado por deixar a carteira na mochila e tanto dinheiro na carteira (nem lembro por que ele estava lá, acho que ia viajar no dia seguinte, é isso). Hoje reconheço que não devia ter feito isso, e procuro ser mais prudente, mas para mim, um clube era um local seguro. Na oportunidade, refleti, e não conseguia (e ainda não consigo) entender como uma pessoa de classe média pra cima (afinal, não há pessoas de outras classes em um clube) pode roubar outro, teoricamente sem precisar. Não estou endeusando a classe média, como se ela fosse virtuosa (longe de mim ter essa visão), mas alguem que não precisa, que tem a vida mais ou menos bem constituida, não deveria, de forma alguma, seduzir-se e roubar o outro, ainda mais por uma quantia que, relativamente, nem é tão alta. (não estou dizendo que 50 reais é pouco, de forma alguma, tanto que fez falta, mas não é algo irresistivel, pelo qual todos fraquejariam, como uma fortuna gigantesca).
E nisso vem a questão da pobreza; até dá pra entender a pessoa que, morrendo de fome, rouba para se sustentar. Ou situações análogas, que remetem à pobreza, pois o pobre já começa espoliado, desde o ponto de partida. Não estou do lado dos que justificam o pobre ser bandido. Acho essa visão relativista demais, pois se adotarmos ela, contribuiremos para a pertetuação da situação, afinal, seria "natural" sua condição de criminoso. Não acho justificavel o pobre roubar, mas acho compreensivel. Acho que, ainda que seja compreensivel, deve ser sim punido. As caracteristicas fisicas do meio-ambiente contribuem em muito para nossa formação, mas sempre há escolha, sempre há saida, do contrário, estariamos adotando uma perspectiva determinista, própria do pensamento liberal, tipica de quem defende, por exemplo, que o aborto em pobres contribui para a diminuição do crime (vide "Freakonomics", de Levitt & Dubner).
Se o pobre roubar é compreensivel (mas não justificável) o que dizer de alguém de classe média? Até hoje, talvez por meus valores morais, por que eu (acredito que) nunca faria isso, não consigo conceber que as pessoas (que não precisam) façam isso; é algo que foge à inscrição na minha memória. Não sei quem era o sujeito de ontem, não sei dizer sua classe. Sei que, em meio à luta ideológica entre liberdade versus igualdade, falta alguém para defender a fraternidade, para nos lembrar que somos todos irmãos, e não deveriamos nos matar, nos roubar. Não sei como concluir esse texto, nem acho que tenha conseguido expressar muito bem, o choque, entre outras coisas... vou ficando por aqui.

sábado, 21 de novembro de 2009

Sobre amigos e festas

Tinha um post pronto para publicar sobre meu "trabalho" na federal, mas um novo assunto se faz necessário. Acordei a pouco, e estou escrevendo, lentamente, ainda tonto. É uma nova experiencia. Meu óculos está torto. Ontem fui na despedida do Ringo, na Centran. Centran, bom lugar pra festas. Saí da reunião do Centro Acadêmico e já emendei, direto. A noite começou já de cara com energético misturado com vokda. Muito, muito bom. Queria mais, mas tinha acabado. Um pouco de cerveja. Sei que estou bebado quando bebo cerveja (e eu virei) e não sinto o gosto ruim. Realmente não gosto de cerveja. Chegou mais energético, que bom! Segunda dose.. O copo era grande, alto, sabe? Bom. Dançei, talvez efusivamente demais, mas vou aprender a dançar a partir de agora quero dançar. Curioso como eu sou "teoricista"; mesmo para entender e viver a realidade, precisa duma teoria. Outro dia estava lendo sobre a virtualização do real. Não lembro se Baudrillard ou Virilio que falam que a dança e o teatro são as ultimas formas verdadeiras de arte, pois exigem a presença no real, mas demais formas de interação estão virtualizadas. Passei a dar mais valor à dança. Dançei. Depois inventaram uma brincadeira. Entrei na fila. Muito bom. Coloca-se sal sobre um pedaço de limão cortado em triangulo. Chupa-se o limão com sal, e segura na boca. Depois engole-se, por cima, uma dose de vokda (mais tarde substituida por velho barreiro, pois a smirnoff acabara). Segura-se tudo na boca. As pessoas ao lado sacodem sua cabeça, para misturar as coisas dentro da sua boca. Sua cabeça é o receptáculo de mistura. Engole-se. Muito bom. Uhul!!, gritei depois de engolir. Segunda vez. Depois da segunda estava bem louco já. Agarrei os peitos de uma menina. Desculpe, Karize, ao menos eu tenho uma desculpa. Fiz malabaris com uma garrafa, e consegui! A técnica até que não é dificil, a Gi ensina muita bem. Dancei, e fui um pouco chato para pessoas que até então eu não era chato. Quero ver como continuarão os relacionamentos a partir de agora. Terceira vez. Depois da quarta vez com a cabeça sendo sacudida, nem gritar mais eu consegui. Sentei um pouco, no sofazinho. Mas decidi ir pra casa, não queria passar a uma imagem muito.. sei lá. Diiculdade para se equilibrar na bicicleta. Dificuldade é eufemismo. Fui empurrando mesmo. Quase chegando em casa, quase fui assaltado. Um cara passou a me seguir, lado a lado. Uma quadra. Ele não pensou que eu já estava chegando, comentou algo sobre o centro (é caminho), pensou que eu ia pra lá. Parei. Abri a portão, entrei. Ele, parou também. Aproximou-se do portão, caminhando para abri-lo. Puxou um objeto pontiagudo. Sem óculos (acho, ou eu estava com óculos?) e ainda bebado, foi impossivel enxergar, sem nitidez ou foco. Provavelmente um canivete. Gritei "não, socorro". Ninguem ouviu, ninguem ouviria. Minha mãe já estava dormindo. Ainda bem que ele não sabia. Montou no bike dele, e saiu correndo. Odeio esses realismos da realidade, tal qual ser assaltado. Meu coração ainda bate forte, pela experiencia. Ainda bem, que acabou bem. Entrei em casa, empurrei para dentro minha bicicleta e subi pro quarto. PC ligado, e-mail aberto. Não vou mais fazer isso, deixar tudo ligado e aberto, quando sair para festas. "Responder a todos", cliquei em um e-mail, que nem havia lido. Tudo bem, pelo menos não foi nada muito demais. Deitei e dormi. Gosto do pessoal do Enuds. Gosto de todos meus amigos, sem preferencias. Gosto de ter amigos. Meus amigos da UTFPR brincam comigo, pelo pessoal ser mais "alternativo", pela temática da viagem a Minas, e congeneres. Mas fiz bons amigos por lá. Não preciso ser gay, para ter amigos gays. Gosto deles, pois são abertos a novas idéias e pessoas, e me sinto realmente acolhido entre eles. Gosto dos meus amigos gays, assim como gosto de meus amigos de Curitiba. Amo todos. E agora vou voltar a dormir.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Sobre relaxar, ler e ver o mar

Comprei um livro. "Sobre formigas e cigarras", de Antonio Palocci. Estava na promoção e barato, com um bom desconto. Na verdade, ganhei o livro, já que meu amigo Carlos o pagou, mesmo que não tendo escrito nenhuma dedicatória. Tenho dez mil coisas atrasadas para fazer (imagine, duas faculdades, mais um "estágio" - falarei do estágio na próxima postagem), mas deixo tudo de lado, para ler o livro. Ele me seduz, e eu o devoro. (duplo sentido sexual demais para o meu gosto, mas vai lá). Geralmente gasto muito tempo para ler. Li metade em um dia, de ontem pra hoje. Adoro histórias da caserna, os bastidores o poder. Não tenho nada muito profundo a comentar sobre isso, só que estou me sentindo de volta aos tempos pré-faculdade, como se estivesse de férias; não levo nada a sério, leio o que eu quero, que nada tem a ver com as faculdades. Só quero ver as notas no fim do semestre, mas também não estou muito preocupado com isso. Hoje acordei ao meio-dia, e o Encon se f.... Desejo sucesso a eles, mas não ia lá mesmo assistir. Foi bom dormir. Quero dormir, ir de bermuda para a aula, ler Palocci, dar um mergulho no mar (como farei daqui a pouco), e curtir a vida. Não vale a pena fazer nada mais, além disso, sem isso.